Alcenor Almeida: responsabilidade social e medicina humanizada

Natural de Palmeiras, o doutor Alcenor Almeida foi um visionário e figura na lista dos homens mais importantes para o desenvolvimento e valorização da medicina brasileira

“Vivi e percorri o curso que a sorte me destinou!” A afirmação é do médico e gestor Alcenor Barbosa de Almeida, registrada no livro “VALEU, DOUTOR - Uma vida de amor e dedicação à Medicina” da escritora Carmen Maria de Almeida, onde ela imortaliza a história de um homem visionário e sua luta em defesa de uma política humanizada de combate ao câncer. Uma vida movida pelo desejo de servir, fato significativo para manutenção da Associação Piauiense de Combate ao Câncer e ao Hospital São Marcos - referência hospitalar na Medicina do Brasil. Partiu no dia 6 de maio de 2019, com quase 93 anos, mas a sua firme lembrança fica guardada na mente e no coração de milhares de piauienses e residentes do meio norte do país.

O médico foi um visionário e está na lista dos homens mais importantes para o desenvolvimento e valorização da Medicina brasileira. Natural de Palmeirais, antiga Vila de Belém, nasceu no dia 12 de julho de 1926, filho do comerciante Raymundo Barbosa de Almeida e Firmina de Sousa Ribeira. O caçula de sete irmãos: Carmen, Antenor, Carmélia, Carmelita, Albenor e Maria Francisca, concluiu o científico no Liceu Piauiense de Teresina e o ensino superior, em 1952, pela Faculdade Nacional de Medicina no Rio de Janeiro.

Por mais de 50 anos trabalhou como cirurgião, fazendo consultas, presidindo a Associação e dirigindo o São Marcos, que na sua administração, cresceu de um pequeno ambulatório para um centro de saúde com atendimento em todas as especialidades, tornando- se referência no tratamento oncológico para boa parte das regiões Nordeste e Norte do Brasil. Além de médico, Dr. Alcenor foi vereador de Teresina, no período de 1988 a 1992. Em 1992, foi candidato a vice-prefeito da capital. Trabalhou como médico no Hospital Getúlio Vargas, no IAPET (Instituto de Assistência e Previdência dos Trabalhadores do Transportes), no IAPC ( Instituto de Aposentadoria dos Comerciários) e no Samdu (Serviço de Assistência Médica Domiciliar de Urgência). O seu legado é conduzido, há algum tempo pelos filhos e colaboradores, com resultados excelentes reconhecidos no Brasil e no exterior. Desde que assumiu a direção da Sociedade Piauiense de Combate ao Câncer, em 1965, a sua história de vida pessoal e profissional se entrelaçaram. A Associação Piauiense de Combate ao Câncer é um sonho idealizado, projetado e executado pelo médico e que sua família leva à frente. Dr. Alcenor implantou um sistema de gestão humanizado para além da cura dos males do corpo, com valores sociais e afetivos. São inúmeros os depoimentos de familiares, amigos e funcionários que creditam a sorte de suas vidas as bençãos do médico gestor. “Foi com profundo pesar que recebi a triste notícia do falecimento de Dr. Alcenor, profissional de competência ímpar, com uma formação humanística reconhecida, foi à frente da Associação Piauiense de Combate ao Câncer timoneiro de perícia invejável, responsável maior pelo seu desenvolvimento e, por consequência, pelo surgimento e desenvolvimento de diversos ramos da medicina no Piauí, notadamente a oncologia. Todos os profissionais de saúde do estado, de uma forma ou outra, são devedores do eterno Dr Alcenor . Eu próprio talvez mais do que qualquer outra pessoa, pelas oportunidades que deu, pelas incontáveis lições que ministrou. Morre o gigante da medicina piauiense, que também conquistou o reconhecimento nacional pela grandeza e o alcance da sua obra, mas fica o sólido trabalho em favor de todos os profissionais da área médica da nossa sociedade e da do meio-norte do Brasil. A palavra mais profunda que posso dizer nesse momento de tristeza, é gratidão! À família desejo força para suportar a perda, ao meu sempre amigo, Dr Alcenor Almeida, muito obrigado!”Jefferson Campelo, diretor técnico de Assistência Hospitalar do HSM.



Alcenor Almeida viveu para servir

*Quando assumiu a direção geral do Hospital São Marcos, construiu 70 leitos, dois pavimentos e um centro cirúrgico com seis salas. O hospital continua crescendo, o ambulatório foi ampliado de oito consultórios para o que tem hoje: 89. Começou funcionando com apenas um só médico e hoje possui 320 médicos e 1909 funcionários. Atualmente o prédio possui três andares, com oito blocos, um centro cirúrgico com dez salas de cirurgia, serviço de hemodinâmica com duas máquinas, três UTIs de dez leitos cada, serviço de quimioterapia com vinte leitos para tratamento ambulatorial, radioterapia com dois aceleradores lineares e um equipamento de braquiterapia. Vale destacar que todo esse serviço de radioterapia é computadorizado.

 Tanto a Associação quando o hospital foram edificados pela confluência de muitos sonhos e ainda hoje dá para sentir que esses mesmos sonhos impulsionam os ideais e princípios que moldam o dia a dia de todos que trabalham na instituição. Cada um desses sonhos, no entanto, tem em comum o desejo de promover uma medicina que torne possível a construção de um mundo melhor e com mais qualidade de vida saudável para a sociedade.

Casado com Claudia Rosa, desde fevereiro de 1955, teve três filhos: Gustavo, Joaquim e Edna. Além destes, deixa mais dez netos e dez bisnetos. O oncologista Paulo Henrique Melo conhece bem toda história do médico, pois foi um dos primeiros a trabalhar no hospital, tornando-se depois genro do Dr. Alcenor. A funcionária Isabel Cristina tem muito a contar também sobre as emoções que viveu no hospital ao lado do nosso personagem.

 Em entrevista ao Jornal Meio Norte, eles representam as falas de familiares e colaboradores e revelam que diariamente, Alcenor Barbosa, viveu para servir.



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“"Ele sempre foi excelente médico como ginecologista, como cirurgião e como administrador. Já naquela época comprou o que existia de melhor em equipamentos modernos para atender os pacientes"."
Paulo Henrique Melo

Dr. Antônio de Pádua Filho foi um dos primeiros cirurgiões oncológicos do Piauí, se não, o primeiro e junto com Dr. Alcenor ajudou a construir esse hospital:

Eu era estudante de Medicina em Recife e um dia vim passar férias em Teresina. Nessa ocasião, uma tia minha iria ser operada e eu perguntei a ela se o cirurgião deixaria eu assistir a cirurgia e ela falou com ele e o cirurgião era dr. Alcenor. Ele respondeu que sim e mandou que eu fosse falar com ele, me apresentar. Eu era bem jovem, começando a faculdade e fui local atrasado, naquela época era na Casamater, que ele operava. Só conhecia de nome. Quando cheguei perguntei por ele e quando ele chegou num opala verde, alguém me mostrou ele. Eu me aproximei, uma outra pessoa falou antes com ele, mas ele tinha a cara assim tão séria que eu fui embora sem falar com ele, porque pensei que ele não ia aceitar. Passou o dia, e ele perguntou pra minha tia porque o rapaz não apareceu e eu expliquei pra minha tia que fui, mas fui embora. Esse foi o primeiro contato e ele ria quando lembrava disso. Bom, continuei a faculdade e aí foi morar comigo e meu irmão um menino que hoje é engenheiro elétrico aqui do São Marcos. O pai dele era conhecido do meu. E quando voltei novamente de férias eu pedir ao Dr. Adonias que me deixasse assistir as operações dele. E ele me respondeu que auxiliava ao dr. Alcenor, mas que me levava sim. E assim eu comecei assistindo as cirurgias do Dr. Alcenor e depois ele me convidou para auxiliá-lo, e daí eu já me sentia um pouco mais confiante, já perguntava quando era a próxima e as horas e quando chegou a época para fazer especialização, nós tivemos um pequeno desentendimento, porque eu pensava em fazer uma coisa e ele insistia para que eu fizesse cirurgia oncologia, praticamente me obrigou, mas foi a melhor coisa que aconteceu na minha vida. Tudo o que sou e o que me tornei como cirurgião devo a ele. Eu sentia que ele me protegia!

JMN: Qual o maior legado e ensinamento de vida deixado por Alcenor Barbosa de Almeida?

PHM: O dr. Alcenor foi um homem de visão, embora com comportamento rígido, era completamente desprendido de vaidades, valores e bens…Um exemplo de homem para se ter um norte e segui-lo. Um ser humano de caráter muito forte sem nunca se desviar daquilo que acreditava. Ajudava os colegas quando precisavam fazer alguma qualificação, ajudava a bancar a formação de jovens médicos, mesmo para queles que não voltassem a trabalhar com ele. Enfim, fazia o bem sem esperar algo em troca. Ao tempo quem lamento sua morte como colega, como sogro e como amigo, fico feliz de ter participado da sua vida. Uma vida dedicada ao país. IC: Aprendi ao logo desse tempo que o maior legado deixado é que a gente faça. Faça dando o melhor da gente e faça com qualidade. Faça com compromisso.

JMN: É comum ouvir relatos da importância do doutor Alcenor na vida dos seus funcionários. O que isso representa?

PHM: Era uma relação, primeiro muito respeitosa da parte deles para com dr. Alcenor e, segundo ele, se comportava como uma espécie de segundo pai, tudo que eles queriam eles conseguiam, principalmente aqueles que começaram a obra do hospital. Era ajuda na saúde, ajuda em uma cirurgia, ajuda na construção de casas. Por muito tempo o hospital comprava moradias e dava de graça para aqueles funcionários que mais se dedicavam no trabalho. IC: Ele era muito próximo de todos. Qualquer colaborador que chegasse no gabinete dele com alguma situação, com algum problema, ele escutada e atendia prontamente. Sempre nos ensinava, se sou uma profissional devo a ele. A visão de negócios que adquiri muito nova quando aqui cheguei insegura foi porque ele acreditou em mim. Ele tinha essa capacidade de incentivar, fazia com que os colaboradores também adquirissem essa confiança, ele nos dava credibilidade para que todos nós também acreditássemos que conseguiríamos.

JMN: O que mais ficou dele no que se refere ao compromisso com a Medicina?

PHM: Foi o desprendimento da sua vida privada para se dedicar a uma obra que ele acreditava ser sua missão, construir um hospital para servir na área de Oncologia, tratando pacientes com câncer, desde cirurgias até as terapias quimioterápicos, e enfim, foi além disso porque abriu as fronteiras do hospital para outros tratamentos de ponta como na parte de rins, cardíaca e na cirurgia de lábios leporinos. Pois uma meta em sua vida e construiu uma obra que ficará para eternidade. IC: A sua busca constante pelo novo com a finalidade de dar o melhor para os pacientes. Tinha uma visão muito além da sua época, sempre preocupado com a qualidade dos serviços. Foi um inovador! Era um gestor que andava paralelamente igual a seu colaborador. Nem muito lá em cima, nem muito embaixo. Ele foi assim desde o inicio, se colocava como igual aos colaboradores, caminhava junto conosco e nos orientava como as coisas deviam ser feitas, embora tivessem momentos em que fosse preciso nos chamar atenção e nos colocar na linha reta daquilo que devia ser feito com compromisso.

JMN: Como a família encara a responsabilidade a dar continuidade a todo esse trabalho?

PHM: O hospital mesmo considerado um centro de referência em saúde sobrevive passando por algumas dificuldades, ocasionadas pela própria situação que o país enfrenta nos últimos anos. Por algum tempo, a Edna passou a auxiliá-lo e depois o Gustavo e o Joaquim assumiram a gestão. Mas tudo continuou como ele queria e fazia, mesmo afastado, ele tinha ideias bastante interessantes que superavam as dos jovens. Sem dúvida, a atual gestão dá continuidade à maneira dele de gerir e isso já acontece há algum tempo. Mesmo sendo uma gestão familiar, o que eles fazem é resultado do que aprenderam convivendo com o pai.

JMN: O hospital é reconhecido nacionalmente por seu alto desempenho no tratamento de pacientes oncológicos. Esse reconhecimento possui relação com o que foi construído pelo Dr. Alcenor?

PHM: Com certeza! Ele sempre foi excelente médico como ginecologista, como cirurgião e como administrador. Já naquela época comprou o que existia de melhor em equipamentos modernos para atender os pacientes. Com sua maneira firme de administrar de ser, foi um cara muito prestativo e humanitário, sempre se dedicando à população dos estados do Piauí, Maranhão, Ceará e de outras partes. Foi um visionário que conseguiu transformar um pequeno hospital em um centro de referencia no Meio Norte do Brasil.

Jornal Meio Norte: Como começou a sua relação com Dr. Alcenor Almeida?

Paulo Henrique Melo: Em Teresina, cheguei formado em 1975 e através de um amigo, o médico Sérgio Ibiapina, conheci um dos médicos da radioterapia, Dr. Arthur Assunção e passei a trabalhar voluntariamente no São Marcos. Logo em seguida, durante um almoço de domingo na casa de um dos parentes, conheci o dr. Alcenor, sua esposa Claudia e sua filha Edna. A Edna, eu reencontrei novamente somente em julho, no litoral. Logo ali, tive que voltar ao Rio de Janeiro por mais seis meses para me qualificar em Oncologia Clinica e quando retornei a Teresina, assumi a parte da Oncologia do hospital. Nessa época, eram apenas dois médicos e fui o terceiro a trabalhar no local. Isabel Cristina: Estava no quarto mês de gravidez, quando descobri que estava com toxoplasmose. Dai não encontrava medicamento no Piauí porque era novo e ainda não tinha chegado aqui. Falei com a irmã Davi e juntas fomos conversar com Dr. Alcenor e ele, no mesmo dia, mandou comprar a medicação no laboratório. Já no sexto mês, minha bolsa rompeu e Maria Vitória nasceu prematura, pesando um quilo e cem gramas, com 36cm, tendo que ficar 53 dias na incubadora. Sabendo da situação, ele mandou depositar um dinheiro na minha conta para ajudar a custear as despesas, mesmo ele achando que ela não sobreviveria por ser muito prematura. Mas ela sobreviveu, graças a Deus. Na época só tinha um médico que tratava de prematuro e ele só atendia quem nascia na Maternidade Evangelina Rosa, como minha filha nasceu no hospital, ele não quis nos atender. Então mais uma vez recorrer ao Dr. Alcenor e ele escreveu um bilhetinho para o médico pedindo o favor e avisando que ele poderia mandar as despesas para cá, que o hospital iria custear tudo. Então o médico nos atendeu, Maria Vitória teve que fazer algumas cirurgias, na esperança de que ela pelo menos pudesse enxergar para se locomover, mas foi um insucesso. Minha filha cresceu com deficiência visual, mas com uma mente brilhante, muito inteligente. Quando ela estava na escola Dr. Alcenor deu de presente sua primeira máquina de escrever em braille. Eu sempre trazia ela no hospital próximo do aniversário dele. Ele era encantado com a minha filha, muito sensibilizado com a inteligência dela . Hoje ela está com 20 anos e ele foi muito importante para nós termos conseguido chegar até aqui, com a ajuda dele. Ela está no Amazonas, para cursar Direito, porque lá é melhor pra ela.

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