Antonio Carlos: Paixão à poesia e aos estudos

O estudante de 17 anos, morador da zona rural do município de São João da Serra, superou desafios e venceu os percalços lendo, declamando e escrevendo poesia. Leitor voraz, ele escolheu fazer Arqueologia na UFPI

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Estudar, improvisar, fazer poesia e ajudar aos pais na roça fazem parte da rotina de Antonio Carlos de Almeida, que aos 17 anos, foi aprovado na Universidade Federal do Piauí para cursar Arqueologia. Mas para chegar ao ensino superior, o jovem morador da localidade Floresta, zona rural de São João da Serra, enfrentou vários desafios.

Filho adotivo de Francisca Romana Almeida e José Alves Almeida, ele tem nove irmãos e cursou todo o ensino fundamental menor nas escolas Nossa Senhora de Fátima e Escola Santa Rita, na zona rural. O ensino fundamental maior foi na Escola Cícero Lopes e o ensino médio no Ceti Professor Ubiraci Carvalho.

O garoto simples vive com a família que o adotou, trabalhadores da roça e mantém bom relacionamento com os pais biológicos Renato de Vasconcelos e Maria da Cruz e por onde passa, deixa sua marca: a força de vontade de vencer na vida. É assim que tem conquistado diretores, professores, todos os alunos das escolas e também de autoridades que visitam o município, como a vice-governadora Regina Sousa que ao ver sua poesia, o homenageou com um notebook. Antonio Carlos é empolgado, organizado e para tudo tem um repente.

Jornal Meio Norte - Como começou sua inserção na literatura de cordel,no repente?

Antonio Carlos - Desde pequeno eu já amava poesia. Quando aprendi a ler, aos 8 anos, tive contato com a literatura de cordel, pois Inácio, um amigo já idoso, trazia seus cordéis para que eu declamasse. Daí por diante fui passando a gostar cada vez mais. Então, em 2001 fui para uma romaria em Novo Santo Antônio e lá minha mãe comprou o folheto "Martiliana, a Santa canonizada pelo povo", do poeta Pedro Costa (in memorian). Foi o estopim (risos). Pensei comigo, bom, eu também posso fazer um. Daí comecei a escrever e não mostrava a ninguém. Somente em 2014, meus professores descobriram o talento em uma gincana na escola Cícero lopes e uma das provas era escrever um poema sobre o Brasil. Escrevi o cordel... Mas teve uma confusão e até hoje não sei quem de fato ganhou a prova (risos). Foi assim que entrei para o lindo universo da literatura popular. 

JMN - O que você mais gosta de ler, com relação a histórias e temas?

AC - Boa parte da minha vida passei na zona rural ao lado dos meus pais, sendo aquele sonhador menino interiorano que sempre teve um orgulho danado de ser nordestino. E assim o que mais gosto de ler são obras de autores nordestinos com temas relacionados ao sertão, desde aqueles que tratam dos dramas vividos por nossa sociedade até os que trazem em seus conteúdo as riquezas naturais e culturais da nossa região. Leio bastante os livretos de cordéis, já que é minha área e fico em estado de êxtase pegar um cordel, deitar numa rede e mergulhar profundamente no imaginário da literatura popular nordestina.

JMN - Quais são seus autores e livros preferidos? Quais autores influenciam seu trabalho?

AC - Na literatura de cordel, os meus preferidos são Leandro Gomes de Barros, José Camelo de Melo Resende, Pedro Costa e o enigmático poeta Patativa do Assaré. Esses são grandes influências. Já dos autores clássicos meus preferidos são Assis Brasil, Rachel de Queiroz e Graciliano Ramos e as obras 'Os que bebem como os cães', 'O Quinze' e 'Vidas Secas', respectivamente.

JMN - Que assuntos você gosta de abordar em suas redações? 

AC - Os assuntos polêmicos que geram grande impacto na mídia e aqueles também que, às vezes, não são noticiados e, no entanto, merecem um olhar mais forte por parte do Estado. A redação é uma ótima ferramenta para expor o que pensamos e contribuir, de alguma forma, para a resolução de algum problema. 

JMN - Nas solenidades oficiais do município você é convidado para participar. Você improvisa na hora ou já leva algum esboço do que vai falar?

AC - Quando sou convidado com antecedência, sempre levo o cordel preparado para não errar. Mas eu improviso também, afinal de contas um poeta sempre tem lá seus truques.

JMN - Você sempre morou na zona rural?

AC - Não posso dizer que sempre morei no interior, mas posso afirmar que grande parte passei na zona rural ao lado da minha família. Foi aqui que caminhei, falei e por 4 anos estudei. Quando passei a cursar o ensino fundamental maior ia no carro dos alunos. Quando fui cursar o Ensino Médio passei a morar na cidade na casa de um amigo. No entanto, nunca perdi o amor pelo meu rincão e a Floresta continuou sendo o meu xodó. Sempre que dava, corria para cá para ficar ao lado da minha família, andar pelos matos e recompor as energias gastas na cidade.

JMN - Como é sua rotina? Como divide seu tempo entre estudo e trabalho?

AC - Eu diria que, na linguagem popular, sou considerado aquele 'cabra molão' que tem uma dificuldade danada se trabalhar nos serviços pesados da roça: brocar, derrubar, capinar, limpar milho, arroz, feijão etc. Sempre gostei mais de estudar, é um serviço maneiro... Desse modo, sempre tive mais tempo para me dedicar aos estudos e escrever meus cordéis, mas sempre que meu pai me chama para ir trabalhar, estou pronto pois sei que é da roça que tiramos o sustento da nossa família e eles sempre quiseram o melhor para mim.

JMN - Quando estiver em Teresina do que vai sentir mais falta da Floresta e da sua cidade?

AC - Com certeza, da minha família; dos meus amigos e principalmente da tranquilidade da minha Floresta Onde tive total liberdade; dos banhos nas cachoeiras com amigos; das vezes que ficava até altas horas na casa do meu primo e também poeta Bartolomeu, conversando, declamando poesia e tomando café; da pelada aos domingos Onde a 'peãozada' se encontra e cada um tem uma história pra contar. Quanta saudade irei sentir dos meus professores , dos meus amigos de turma; dos banhos de piscina; dos aniversários surpresa. Tantas vezes saíamos a andar pela cidade , íamos para praça conversar tomar um refrigerante e naquele momento nos sentíamos as pessoas mais felizes do mundo. Tudo isso vai servir de combustível e fazer com que siga feliz a minha caminhada.

JMN - Você se inscreveu no SISU para história e depois Arqueologia. Qual curso você prefere?.

AC - Diria que os dois. Sempre gostei das disciplinas de história, apesar de saber que todas são importantes. No entanto, terminei por optar por Arqueologia porque pelo que pesquisei essa ciência estuda o passado de forma mais profunda e mais na prática que na teoria. São diferentes, mas no final de contas andam de mãos dadas.

JMN - Como foi o seu preparatória para o ENEM?

AC – Felizmente, pude usar de diversas ferramentas e meios para me preparar. Tive um acompanhamento rigoroso com os meus professores, principalmente na disciplina de redação com a professora Elis Regina, que sempre estava ali ao nosso lado com propostas, atividades e dicas valiosas. As professoras Antônia da Luz (que inclusive é minha madrinha ) e a professora Carliane também deram fundamental apoio, assim também como os demais professores. Participei ainda do preparatório pelo Canal Educação com aulas ao vivo, revisões e corujãoem Teresina. E sempre tirava um tempinho para ver um vídeo, fazer um exercício e assim eu consegui êxito.

JMN - Você disse que leu Beira Rio Beira Vida e Os que bebem como os cães, o que você tá lendo atualmente? 

AC - Sempre leio diversos cordéis de outros autores, participo de grupos no watshaap e sempre estou viajando no universo poético do cordel. Mas em relação a obra estou lendo 'Nos caminhos do repente', do escritor e poeta Pedro Mendes Ribeiro. Muito bom, recomendo.

JMN - Qual a sua expectativa em relação a mudança para capital? 

AC - Espero me adaptar a esse novo modo de vida. Será muito diferente da que eu levava no meu município. Quero fazer novas amizades, crescer enquanto pessoa e concretizar o meu sonho de ter um curso superior que aos poucos vai se tornando realidade.

JMN - Você esperava alcançar uma pontuação tão alta na redação? 

AC - Para ser sincero, não. Eu sabia que estava preparado, no entanto, a insegurança e a imaturidade limitavam a minha mente de pensar que chegaria aos exatos 920 pontos na redação do ENEM 2018.

JMN - O que o cordel significa para sua vida?

AC - Significa meu tudo no meio do meio do nada e com ele posso conquistar tudo. O cordel é, para mim, um dom de Deus e faço uso desse instrumento para dar voz ao meu povo, louvar nosso Criador e viajar por um universo infinito, onde tudo pode ser modificado com uma simples pincelada de poeta.

JMN - Qual a sua mensagem para os estudantes que farão o próximo ENEM?

AC - A confiança e a dedicação são armas fundamentais para você conquistar aquilo que você almeja. Seja forte, confie em você mesmo e o mais importante, nunca perca sua identidade. E estude, pois é através da educação que podemos quebrar tantas barreiras e chegar ado topo do pódio. Termino com uma reflexão bíblica que diz "e conhecereis a verdade e a verdade vos libertará ".



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