Depois que fotos íntimas pararem na web, mulher sofre preconceito

O caso ocorreu no fim de 2005, logo após o fim do relacionamento do casal.

Rose Leonel ganhou a causa na Justiça em 2010 | (Foto: Jackson Yonegura / Arquivo pessoal)
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Quase oito anos após ter fotos íntimas divulgadas pelo ex-noivo na internet, a jornalista Rose Leonel, que mora em Maringá, no norte do Paraná, afirma que sofre preconceito constantemente. ?Muitas pessoas, tanto homens quanto mulheres, ainda me recriminam pelo que aconteceu, infelizmente", declarou. O caso ocorreu no fim de 2005, logo após o fim do relacionamento do casal. De acordo com a jornalista, o ex-companheiro não aceitou o fim do noivado e, além de divulgar as imagens ainda insinuou em redes sociais que ela era uma garota de programa. A desavença foi parar na Justiça.

Em 2010, Rose teve a causa ganha. Contudo, ainda não foi indenizada. Leonel não aceitou o valor arbitrado, de R$ 30 mil, e tenta recusos para aumentar a quantia.

Ao site, o advogado Thomaz Jefferson Carvalho, afirmou que atitude do ex-noivo configura crime de injúria e difamação e o valor imposto não é compatível. "Dentro disso, ela sofreu vários transtornos. Entre eles perdeu dois empregos e foi julgada pela sociedade em geral", relata. O advogado disse que aguarda uma decisão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) sobre o caso.

?Apesar de não ter recebido nenhum centavo ainda, quando a sentença saiu, eu me senti aliviada?, conta a jornalista. ?Foi um alívio moral (...) como se eu tivesse recebido uma absolvição social. Depois da sentença, eu acho que ficou claro para a sociedade que eu era a vítima e ele [o ex-noivo] era o culpado da situação?, completa Rose.

Ela também não concorda com o valor arbitrado pela Justiça. "Além de ser vergonhoso, moralmente falando, perdi muita coisa. Fico me perguntando quanto vale a vida de um ser humano. Será que é só isso??, indaga Leonel. ?Não acho justo e muito menos digno de recuperar o que eu passei e passo até hoje?. ?Minha vida ficou marcada por esse crime. Fui assassinada moralmente?.

Rose relembrou sobre o fim do relacionamento. ?Depois de quase quatro anos de namoro, percebi que ele não se dava bem com os meus dois filhos e que um possível casamento não daria certo. Aí resolvi terminar de vez. Ele ficou totalmente transtornado e me ameaçava por telefone quase todos os dias?, relata.

O advogado do ex-noivo da jornalista, Israel Batista de Moura, relatou que o cliente é inocente. ?Nós ainda não consideramos esse caso como encerrado. As denúncias feitas são totalmente nulas e inválidas. Já constatamos que o perito errou muito e não tem habilidade técnica para entender sobre o assunto?.

Leonel contou ainda que descobriu a intenção do ex em publicar as fotos através do e-mail dele. "Como eu ainda tinha a senha dele, acessava o e-mail quase todos os dias só pra ver como ele estava. Em um desses acessos descobri uma negociação com um técnico de informática, onde ele perguntava como deveria proceder para publicar fotos minhas e quanto custava. Depois de 15 dias de negociação, ele pagou R$ 1 mil em aparelhos, que facilitariam a publicação das fotos", argumenta. Foi a partir daí que a jovem decidiu denunciar o rapaz.

?Além de publicar as imagens, ele divulgou o telefone da minha casa, do meu trabalho e o celular do meu filho?, lembra a jornalista.

Projeto "Maria da Penha Virtual"

Na tentativa de ajudar outras vítimas do mesmo crime, Rose criou, em maio deste ano, o projeto de lei ?Maria da Penha Virtual?. O estudo foi considerado inconstitucional pela Assembleia Legislativa do Paraná (Alep) e atualmente tramita na Câmara dos Deputados, em Brasília, sob a defesa do deputado federal João Arruda (PMDB). O projeto já passou por duas audiências públicas e não há data para votação.

"Nós nos baseamos em torno da Lei Maria da Penha, que configura o crime de violência doméstica, mas hoje atinge a internet. O crime na internet fica gravado (...), arquivado. São casos em que, como o da Rose, ex-companheiros utilizam a rede para se vingar. E isso pode ser considerado um crime tão brutal quanto uma agressão física, por exemplo", argumenta Arruda. "Então, a nossa intenção com o projeto é ampliar a Lei Maria da Penha e, talvez, criar penas mais rigorosas", acrescenta.

?Eu quero, através desse projeto, passar uma experiência para as outras vítimas que é preciso superar as dificuldades e voltar a viver. Vou levar isso como uma bandeira e como uma missão?, aponta Leonel. ?Ainda estou recomeçando. Tento reaprender a cada dia como me portar em sociedade, a recuperar a auto-estima e, acima de tudo, a viver. É um processo longo, eu não posso afirmar que já consegui. Mas, graças a Deus, tenho conseguido superar a cada dia. É um exercício constante que exige muita paciência?, completa.

Em abril de 2013 entrou em vigor a lei ?Carolina Dieckmann?, que, entre outras coisas, torna crime a invasão de aparelhos eletrônicos para obtenção de dados particulares. Sancionada em dezembro de 2012, a alteração do Código Penal foi apelidada com o nome da atriz, após fotos em que Carolina Dieckmann aparecia nua terem sido divulgadas na internet.

A diferença entre os dois crimes, segundo Arruda, é que o caso de Rose é voltado apenas para mulheres. "Os dois são bem diferentes. O Carolina Dieckmann, é voltado não só contra mulheres, envolve rackers (...), entre outros. Já o da Maria da Penha Virtual trata de crimes somente contra mulheres", explica o deputado.

Vida "marcada"

A jornalista acrescenta que teve a vida ?marcada pelo crime?. ?Eu vou ficar marcada para o resto da minha vida. Eu vou ter que conviver com isso. Fui vítima de um crime na internet e isso, infelizmente, querendo ou não, faz parte da minha identidade?.

A maior parte das pessoas acha que pelo simples fato de eu ter sido exposta, que eu sou culpada. Muitas, ainda, não querem nem saber do expositor, do criminoso. Com certeza, fui e ainda sou a maior prejudicada nessa história?, declara.

Na época do resultado da sentença, o perito digital Wanderson Castilho disse que a abrangência com o nome de Rose na internet chegou a sete milhões e quinhentos mil links relacionados. Quando eu entrei na parte de mensagens instantâneas, era um pedido para adicionar a cada três segundos, sem contar que ela recebia pelo menos 500 ligações por dia", relatou.

?Apesar de tudo, acho que ao longo dos anos, o preconceito foi diminuindo. Mas ainda recebo e-mails diariamente me alertando sobre as fotos e sobre o que aconteceu. Como esse tipo de crime passou a acontecer com mais frequência, acho que as pessoas passaram a entender melhor o que significa?, ressalta Leonel.

Perdão

Rose afirma que o perdão em relação ao ex-noivo é necessário para suportar os desdobramentos diários do crime e para poder seguir em frente. ?Eu já liberei o meu perdão pra ele. Eu sinto que eu tenho que fazer isso porque as sequelas do crime são diárias. Como está na internet, é uma coisa com consequências vivas. Então, eu tenho que perdoá-lo constantemente. Tenho que fazer isso pra poder seguir em paz com a minha vida. Acima de tudo, acho que ele foi uma pessoa extremamente infeliz quando fez isso e que no fundo deve ter se arrependido?.

Futuro

Atualmente protegida pela Lei Maria da Penha, o que impede a aproximação do ex-noivo, a jornalista afirmou ao G1 que busca um novo amor e que pretende se casar novamente. ?Eu fiquei um pouco traumatizada com tudo isso. Até já tentei namorar novamente, mas não consegui. É muito difícil conseguir confiar em alguém de novo?.

?Não quero ficar sozinha e tenho o sonho de ainda encontrar um grande amor. Sou uma pessoa muito família. Quero alguém do meu lado para me apoiar e me fazer feliz?, afirma.

Desde que o caso veio à tona, o filho mais velho de Leonel precisou mudar-se para a Europa para, segundo ela, evitar represálias.

Rose Leonel mora com a filha mais nova e, além de atuar na profissão de jornalista, mantém uma ONG, a qual também defende o assunto.

?Eu quero que essa tempestade passe logo para poder me firmar profissionalmente de novo. As coisas ainda não estão como deveriam. E sonho em viver com os meus dois filhos aqui, sem medo de ser feliz?, finaliza, emocionada.



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