Laurinha: Uma pequena grande piauiense

“Se você ouvir os roubadores de sonhos, você não faz nada. Você tem que sonhar e buscar realizar. Não precisa contar para ninguém, mostre apenas o resultado”

Laurinha | Raíssa Morais
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Laura Maria Marques, nascida no dia 4 de julho de 1963, em Esperantina, cidade localizada há 187 km ao Norte de Teresina, a popular “Laurinha”, é um verdadeiro ícone do Piauí. Uma voz incessante pela busca de direitos para a pessoa com nanismo, a recepcionista, empreendedora e modelo é conhecida em todo o Estado pelas campanhas publicitárias que estrelou nos anos 2000. Supermercados, lojas de departamento, todo mundo quis “colar” no sorriso farto de Laurinha, que no auge dos seus 96 cm esbanja a simpatia da grande mulher que é. Além disso, ela ministra palestras sobre autoestima e leva uma palavra de força para aqueles que precisam encarar a vida de frente.

 Uma batalhadora desde os anos 80, quando decidiu tentar a sorte na capital, Laurinha mostra a independência de uma mulher forte que tem objetivos concretos. Com Roberto Carlos como trilha sonora, são “tantas emoções” na vida deste verdadeiro brilhante piauiense.

Tamanho não é documento. Nem desperta a dignidade da alma. Laurinha mantém na pose firme uma sorriso solto que vem com facilidade. Em meio ao preconceito, ela afirma que o carinho das pessoas supera qualquer adversidade. Para NOSSA GENTE, Laura Maria Marques é uma inspiração para um mundo melhor onde a igualdade prevalece, independente das condições físicas. A palavra de Laurinha é uma força incessante pela busca de dignidade e respeito pelas pessoas acometidas com o nanismo, que é embora seja considerada uma deficiência física, ainda é marcada por uma série de tabus.

Jornal Meio Norte: Você sempre lidou bem com sua condição física?

Laura Marques: Eu costumo dizer que nossos pais, além de mim tenho outra irmã que também é anã, não nos tratavam diferente dos irmãos “grandes”. Eles não faziam diferença. Fomos criados iguais, fazendo tarefas domésticas, tudo. A gente só não fazia o que não podia mesmo. Não tinha aquela coisa de superproteção. Isso nos ajudou a enfrentar o mundo. O que chamam hoje de bullying a gente pegou muito sem saber o que era.

JMN: Como é lidar com o preconceito?

LM: Meu amigo, não tenha dúvidas que sofro. Só se eu não sair de casa. Para trás eu sofria, porque eu era crua, não tinha leitura e nem conhecimento. Mas com o tempo a gente vê que o ser humano não é 100% humano. Não posso cobrar que as pessoas sejam educadas se elas estão cobertas de ignorância, não receberam educação adequada.

Não posso cobrar o que eles não têm para dar. Não me ofendo porque é ignorância. Alguém que me conhece, me admira e me respeita jamais vai me tratar mal. E é isso que importa. Mas se você quer ver “baixaria”, basta me acompanhar um dia no mercado. Eu vendo um mix de castanhas, com uvas passas. Então tenho que ir sempre comprar material. O povo grita, tira foto...

JMN: Como isso acontece?

LM: São as piores piadas. Eu uso um bracelete magnético, que inclusive vendo também, porque é bom para a circulação, e uma vez uma moça disse para mim que o relógio era maior que eu, e disse: “ainda é zangada!”.

JMN: Você acha que o teresinense é do tipo que olha as pessoas de cima abaixo?

LM: Acho. Aqui as pessoas se incomodam demais com a vida alheia. Com aparência. Se é magro, gordo, pequeno, grande, branco, preto, amarelo. Eu até estranho porque se eu fosse uma pessoa que não saísse de casa, tudo bem. Causaria um estranhamento. Mas o que me estranha mesmo é porque todo mundo me conhece, já fiz propagandas, as pessoas sabem quem sou. Por que eu caso tanto choque assim? Um dia desses eu fui em uma loja de tecidos e um casal ficou tirando fotos minhas. Pensei que era do tecido que eu estava escolhendo e me afastei, mas eles foram chegando mais perto. Eles gritaram “lá vai ela, lá vai ela”. Custava pedir a foto? Mesmo que fosse um fã, não alguém frescando. Não sou fresca, posaria sem problema. Mas tem dias que você não está a fim, sabe? Não é todo dia que você está com bom humor ou com a aparência boa para foto.

JMN: Qual a lição de vida que você tem?

LM: Superação. Respeito. Diante de tudo isso eu filtro. Tem coisas ruins, mas 90% do tempo é bom. As pessoas gostam de mim, me respeitam. Conquistei meu espaço. Eu já fiz meu nome. Sou independente. Não quero ser mais do que ninguém, mas sou do jeito que sou e pronto. Se eu sair na rua e disserem que estou feia, meu vestido está feia, estou gorda, azar o da pessoa. Com calma e jeito você consegue tudo. No meio da minha situação existe muito a falta de acessibilidade.

JMN: Falando em acessibilidade, o que você acha da existente em Teresina?

LM: É zero. Tem acessibilidade, ruim, diga-se de passagem, para surdo, cego, cadeirante, tudo. Mas para anão, meu amigo. Não tem nada para o nanismo, que foi considerada uma deficiência física em 2004. Dentro das minhas atividades, vendo cosméticos, faço treinamentos. Fui em um hotel belíssimo em Luís Correia, mas quando chego lá não alcanço o chuveiro. Eu liguei para a recepção e disseram que eu deveria usar a cadeira de escritório que tinha no carro. Eu falei que não estava acreditando no que ouvia. Como assim eles não tinham um plano b? Em pleno século XXI não tinha um banquinho? O staff do evento teve que me resolver. Isso no final de 2016. Mas em 2017 foi diferente. Fui a Salvador, para um show do Roberto Carlos, o Emoções. Fui sozinha. Mandei um e-mail para eles e o tratamento foi completamente diferente. O quarto tinha acessibilidade e fui muito bem tratada. Já fui em Santos e virei cliente desse show, porque eles me paparicam tanto...

JMN: Você é uma grande fã do Roberto Carlos. Como começou isso?

LM: Eu estive uma vez no camarim com ele. Eu gosto muito dele. Ele fez muitas músicas para mim. Fez “Lady Laura”, fez “Mulher Pequena”. Eu gosto dele. Na verdade ele fez Lady Laura para a mãe, mas peguei carona. Ele só não faz é saber que fez para mim. Sou fã dele desde que fui ao primeiro show dele aqui em Teresina. É um ser humano que tem letra. O que ele fala faz sentido.

JMN: Como é sua vida profissional?

LM: Sou recepcionista aqui no Creas. Muitas pessoas na minha condição ficam reclusas, mas eu sempre fui diferente.

A família superprotege. Tem gente que não suporta ser olhada, que já fica deprimida. Mas sempre trabalhei. Preciso ter meu sustento. Os boletos com código de barras chegam todo mês. Além deste meu trabalho, eu também sou vendedora. Vendo torresmo, vendo cosméticos, vendo um mix de castanhas saudável. Hoje tenho minha casa própria, que é toda acessível. Hoje só pago condomínio. Se você ouvir os roubadores de sonhos, você não faz nada.

Você tem que sonhar e buscar realizar. Não precisa contar para ninguém, mostre apenas o resultado. Atualmente moro no Morada do Sol, zona Leste. Mas já vendi título de capitalização, já trabalhei em loja… Já vendi semijoia em pano. Nunca fiquei parada. Cheguei ao Creas através do ASAS da Arquidiocese de Teresina, com ajuda da vereadora Graça Amorim. (Por Lucrécio Arrais)



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