Recuperação é uma nova chance para viver sem drogas

Deixar de usar drogas é um processo lento e difícil. A abstinência e até mesmo a difícil aceitação do problema tornam a recuperação mais complicada.

FARNEY | Passou 9 meses em tratamento, largou e voltou a usar a droga três meses depois | Jonathan Dourado
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Depois de entrar no mundo das drogas, reconhecer a necessidade de tratamento é o primeiro passo para a recuperação. Mas isso é um processo difícil, que necessita não só do apoio familiar, mas deve vir atrelado a um tratamento contínuo para a reinserção na sociedade.

Em muitos casos, a abstinência e até mesmo a difícil aceitação do problema tornam o processo de recuperação ainda mais difícil e contribuem para as recaídas.

Na Fazenda da Paz, uma das comunidades terapêuticas que acolhem dependentes químicos no Piauí, 18,5% dos dependentes químicos já passaram por tratamento anteriormente. Como foi o caso de Elenilson Barbosa, que hoje tem 28 anos, mas tinha apenas 11 quando experimentou a maconha e o processo de destruição.

Apesar de ter procurado ajuda quando viu que já não tinha forças para lidar sozinho com o problema, chegou a deixar o tratamento uma vez pelo desejo de voltar a ter uma vida normal.

?No começo foi muito ruim. Passava por momentos de ansiedade, nervosismo, tinha dor de cabeça e ficava com muita raiva. Também não era acostumado a normas e saí por força de vontade.

Depois retornei, por vontade também, mas dessa vez trabalhei em cima dos meus defeitos. Quando entrei pela primeira vez, estava apenas passando o tempo. Mas eu precisava trabalhar meu defeito de caráter e melhorar meu lado espiritual?, explica.

Assim como Elenilson, muitos outros internos de comunidades terapêuticas sentem a mesma dificuldade: conseguir aguentar a abstinência e focar na reabilitação. Farney Francisco é um retrato de muitos usuários.

Começou usando drogas menos pesadas, até chegar ao crack. Passou 9 meses em tratamento, largou e voltou a usar a droga três meses depois de ter saído. ?Eu estava obcecado. É como se eu tivesse em uma tarde no sol quente e com sede sem ter água?, explica.

Depois de seis meses voltou para a comunidade terapêutica, desta vez decidido a se recuperar. ?Na primeira vez eu não vim por mim. Vim pelos outros. Mas por sofrer lá fora decidi fazer tratamento por mim. O crack tirou toda a minha alegria e se não fosse por mim ia morrer?, lembra.

Ronaldo dos Santos é outro exemplo de quem conseguiu permanecer, mas admite as várias vezes que pensou em sair. ?Eu fui embora uma vez que ninguém viu.

Na segunda, com 4 meses depois de ter retornado, deu vontade e fui, mas na estrada encontrei um dos coordenadores que não me deixou ir embora. Eu fui na estrada, mas pedindo a Deus para me dar forças para ficar e ele colocou o coordenador. Aqui é um ajudando o outro. Na hora que fala que vai embora, dá o máximo possível para não sair?, diz.

Augusto César, hoje um dos coordenadores da comunidade terapêutica, explica o porquê de ser mais fácil a adaptação depois de retornar pela segunda vez ao tratamento. ?Da segunda vez já está acostumado com as regras, já sabe como funciona, sabe a rotina. Mas não deixa de ser difícil?, ressalta.

Segundo o coordenador geral, Célio Luiz Barbosa, vários fatores contribuem para a recaída. ?É preciso entender que o tratamento tem que ser para a vida toda.

Não adianta o dependente químico achar que se curou. Isso não existe. O dependente químico tem que participar de grupos de apoio, ter ajuda da família e ficar sempre vigilante às amizades e lugares que frequenta?, ressalta Célio.

Mudança de hábitos da família ajuda na recuperação

Depois de saírem do tratamento, muitas famílias acreditam que o dependente químico esteja completamente curado.

Contudo, o tratamento terapêutico não é a garantia de uma recuperação para toda a vida. A transformação acontece também na vida da família que precisa até mesmo rever hábitos dentro de casa para evitar a recaída. Enquanto a família tem o papel de apoiar o dependente nessas situações, por outro lado, ele também deve ter consciência dos riscos.

Segundo o coordenador geral da Fazenda da Paz, Célio Luiz Barbosa, um dos grandes problemas é que o álcool, que não é visto pela maioria como uma droga, se torna um grande vilão do tratamento porque está presente nos lares, nas festas em família.

?As pessoas que convivem com o dependente químico devem experimentar também uma mudança de hábitos. Evitar festas com bebida alcoólica dentro de casa, não levar o dependente para bares ou locais onde o álcool é a estrela principal. Oferecer bebida é algo que não se deve nem cogitar?, ressalta Célio.

Evernando reconhece que não está completamente recuperado, mas sabe que é com força de vontade e apoio familiar que poderá conseguir manter o vício distante de sua vida.

?Não estamos recuperados. Não é uma coisa que diz que ?estou livre?. Se eu quiser me alimentar do vício, eu consigo destruir seis anos de construção em 5 segundos.

Mas é preciso força de vontade. E apoio da família. 90% hoje eu dependo da minha família. Já não procuro na rua, procuro em casa. E eu tenho que acreditar em algo que possa me fortalecer todo dia. Mas vai depender de mim?, explica.

Quando fala sobre esse assunto, o coordenador da Fazenda da Paz tem o conhecimento de quem também é um dependente químico. ?Eu estou há 28 anos sóbrio, mas no dia que colocar uma gota de álcool na boca, seja uísque, cerveja ou cachaça, eu sei que vou recair no uso de outras drogas, porque sou um dependente químico e isso não vai mudar nunca. Por isso, o álcool não faz parte da minha vida?, admite Célio.

Mercado de trabalho ajuda a evitar recaídas

Uma das formas de contribuir para que os dependentes químicos em processo de reabilitação não retornem para o vício é ajudá-lo a manter a cabeça sempre ocupada.

E garantir um emprego é um ponto de partida para uma mudança de vida. Na Fazenda da Paz, 48% dos dependentes químicos que concluíram o tratamento em 2011 e 2012 já estão empregados. Por outro lado, as dificuldades encontradas para conseguir trabalho é uma das motivações da recaída.

O preconceito ainda vem a ser um grande empecilho. Farney Francisco está se recuperando em uma comunidade terapêutica, mas diz que depois da dificuldade de reconhecer o problema, o preconceito é um dos principais fatores que interferem nesse processo de recuperação.

?Muitas pessoas têm preconceito. Algumas vezes saio lá fora e as pessoas passam por nós, mas quando veem de onde viemos saem de perto. Mas eu tenho que encarar. Foi eu quem causei isso?, conta.

Da mesma forma acontece no mercado de trabalho. Contudo, mesmo que exista o preconceito, isto atrelado à falta de capacitação profissional dificulta mais ainda a reinserção na sociedade. Portanto, adquirir experiência em alguma atividade já é a porta de entrada para a vida profissional, e mais, ajuda na reabilitação.

Evernando Pereira dos Santos é exemplo de quem estava no fundo do poço, mas conseguiu reestruturar sua vida através do trabalho. Com as aulas que teve de mecânica, montou sua própria oficina e hoje pode se considerar um microempresário. Aos 36 anos, ele mudou totalmente a sua vida. Mas ele diz que a questão financeira atrelada ao mercado de trabalho traz suas dificuldades.

?Está difícil achar emprego e isso dificulta ainda mais a questão de se manter distante da droga. Mas não existe emprego ruim, existem funcionários que não querem trabalhar. Todo trabalho tem que ter normas para ter organização, um mínimo de controle e é preciso se adequar?, explica.



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