Zé Carlos e Paulão criticam fim de investimentos da Eletrobras

O deputado Paulão classifica o desmonte que o governo vem fazendo no setor elétrico brasileiro como “criminoso

Zé Carlos e Paulão criticam fim de investimentos da Eletrobras | Divulgação
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A busca do lucro fácil por parte dos acionistas da Eletrobras pode provocar uma imensa perda nas pesquisas brasileiras sobre energias elétrica e eólica, refletindo no aumento dos preços das tarifas, na qualidade do serviço prestado à população e deixando o Brasil dependente de know-how e de equipamentos fabricados no exterior.

Na última assembleia dos acionistas da Eletrobras, realizada em 28 de janeiro, ficou decidido que a estatal não tem mais obrigação em investir e manter o Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica (Procel), o Programa Nacional de Universalização do Acesso e Uso da Energia Elétrica (Luz para Todos), responsável pelo atendimento a mais de 16,8 milhões de pessoas que passaram a ter acesso à energia elétrica, em regiões sem acesso a esse serviço público essencial; e o Centro de Pesquisas de Energia Elétrica ( Cepel), o maior centro de pesquisas de energia elétrica da América do Sul.

“É muito preocupante presenciar mais uma ação do governo no sentido de enfraquecer a Eletrobrás. Obviamente, todo mundo já percebeu a intenção, que é enfraquecê-la para que seja totalmente privatizada. O governo continua insistindo em um ato extremamente lesivo à pátria brasileira”, afirmou o deputado Zé Carlos (PT-MA).

O deputado Paulão (PT-AL) classifica o desmonte que o governo Bolsonaro vem fazendo no setor elétrico brasileiro como “criminoso”. “Ele – Bolsonaro – desmontou tudo. Ele está entregando aos estrangeiros, inclusive a multinacionais estrangeiras, uma boa parte dessas empresas que estão sendo vendidas e compradas pelas estatais chinesas, francesas e espanholas. O governo Bolsonaro, o Ministério de Minas e Energia e os generais estão trabalhando nesse projeto que afronta e lesa a soberania nacional. É um verdadeiro crime contra o patrimônio do povo brasileiro”, criticou o parlamentar.

Paulão ainda explicou que os governos petistas fortaleceram o setor elétrico e com o Programa “Luz para todos”, que levou energia para as regiões Norte e Nordeste, universalizando a energia e se tornando um ganho para essas regiões e para todo o Brasil.

Mudanças no Estatuto

Especialistas também alertam que essas mudanças do estatuto ameaçam o desenvolvimento do país e a preservação do meio ambiente, além de um programa bem sucedido, como o Luz Para Todos, criado em 2003 pelo então presidente Lula e que, além do acesso à energia, movimentou a economia e gerou quase meio milhão de empregos direitos e indiretos. O programa utilizou 7,9 milhões de postes, 1,15 milhão de transformadores e 1,5 milhão de quilômetros de cabos elétricos (o suficiente para 38 voltas ao redor da Terra). Além do impulso ao setor de materiais elétricos, o programa beneficiou também a indústria e o comércio de eletrodomésticos, entre outros.

Tudo isso pode virar pó, pois o texto do novo estatuto estabelece ainda que se a União determinar investimentos em programas de governo, a Eletrobras deverá ser ressarcida pelos cofres públicos, o que afronta o artigo 173 da Constituição Federal que estabelece que os interesses coletivos e sociais são funções primárias de empresas estatais.

Todo este desmonte da Eletrobras visando a privatização da empresa é visto com preocupação pelos pesquisadores do Cepel, já que é o Centro responsável pelo desenvolvimento de softwares que controlam a distribuição de energia em todo o país. Como o Brasil tem o maior sistema interligado de energia do mundo, é o equilíbrio da distribuição que permite atender todo o território nacional, já que os grandes centros do país ficam, em sua maioria, distantes das hidrelétricas.

“A voltagem de todo este sistema interligado é enorme e quando falta energia no Sul, por exemplo, e há folga no Nordeste, o sistema consegue organizar a distribuição, evitando a possibilidade de apagões”, diz Antonio Carlos de Barros Neiva, Doutor em engenharia mecânica e pesquisador do Cepel na área de energia eólica.

Neiva explica ainda que o software desenvolvido pelo Cepel é utilizado pela Organização Nacional do Sistema (ONS).

Outro importante software desenvolvido pelo Cepel é o de planejamento que calcula o melhor preço da energia, a fim de ter parâmetros de menor custo possível.

“Isto é importante para que o consumidor não pague um preço acima do que é devido. E nos preocupa o fato, além da decisão da assembleia dos acionistas da Eletrobras, do governo ter editado a MP nº 232 que retira do Cepel está atribuição. O impacto nas contas do consumidor será imenso se agentes do mercado controlarem os preços da energia elétrica”, alerta Neiva.

Outra área importante que o Cepel cuida é a do desenvolvimento com ensaios para a indústria em geral e para o setor elétrico. É o Centro que faz testes com grandes transformadores de energia, para dar maior confiabilidade nas estações de energia e nas linhas de transmissão, evitando perdas, para que as tarifas sejam menores.

“As linhas que trazem a energia de Itaipu, na fronteira com o Paraguai, e de Belo Monte, no Pará, trabalham com tensões muito elevadas para minimizar as perdas. Os testes com tensões acima de 500 mil volts só puderam ser feitos nos laboratórios de Ultra Alta Tensão, do Cepel, instalados em Adrianópolis, a 50 km da capital do Rio de Janeiro. Sem o Cepel esses testes terão que ser feitos fora do país com um alto custo para os brasileiros”, afirma Neiva.

Segundo engenheiros da Eletrobras, se um sistema de monitoramento desenvolvido pelo Cepel estivesse instalado nos transformadores da subestação do Amapá, teria evitado o apagão, que durou 22 dias. Sem financiamento, o Cepel não poderá continuar a realizar pesquisas e prestar serviços estratégicos que evitam falhas de equipamentos, como o recentemente ocorrido em Macapá.

Até mesmo a identificação de ligações clandestinas, os chamados “gatos” também são focos de desenvolvimentos feitos no Cepel.

“Identificar perdas ‘não técnicas’ nas redes de distribuição, ajuda a evitar aumentos nos preços da energia. Quem paga o ‘gato’ é o consumidor regular“, diz o engenheiro.

Perdas na pesquisa de energia eólica e renovável

Num momento de transição energética em que o mundo discute uma maior utilização de veículos elétricos e de energias renováveis, o uso de energia eólica é indispensável para o desenvolvimento do país.

Enquanto na Europa, os equipamentos de energia eólica são adequados a grandes rajadas de ventos, comuns naquele continente, no Brasil o vento é constante e mais leve, especialmente na região Nordeste, o que é uma vantagem para o país no armazenamento e na utilização deste tipo de energia.

“Os equipamentos são de alta tecnologia desenvolvidos em laboratórios com especialistas trabalhando com isso há décadas, se a gente não tiver o Cepel, vamos ter de importar know-how estrangeiro que não é adequado às condições climáticas do Brasil”, critica Neiva.

A decisão dos acionistas que desobriga a Eletrobras a investir no Cepel é ainda pior do que o projeto de privatização, que ao menos, prevê mais quatro anos de investimentos obrigatórios no Centro de Pesquisas, após a venda da estatal.

O Centro de Pesquisas de Energia Elétrica

O Cepel, localizado na Ilha do Fundão, na Cidade Universitária, Rio de Janeiro, atua há mais de 45 anos em prol das empresas Eletrobras e do setor elétrico nacional, em vários temas estratégicos para o país como energias renováveis, eficiência energética, novas tecnologias para o setor.

Atua em parceria com universidades, proporcionando o desenvolvimento de recursos humanos altamente qualificados em toda a estratégica cadeia produtiva do setor elétrico.

Após o apagão em 2009, o Cepel realizou ensaios em seus laboratórios que identificaram as causas da falha. A partir de 2012, os reservatórios ficaram baixos, mas as simulações do Cepel mostraram que não seria necessário o racionamento. Com a gestão e o monitoramento de equipamentos e instalações, as falhas têm sido evitadas.

O Cepel evitou ainda perdas de dezenas de milhões de reais para empresas como Eletronorte, Amazonas GT, Ceron e Amazonas Energia. Somente na Eletronorte evitou-se a perda de R$ 40 milhões no primeiro semestre de 2020.

O Cepel é uma pessoa jurídica de direito privado sem fins lucrativos, constituído sob a forma de associação civil. Aproximadamente 80% de seus recursos são provenientes das fundadoras do centro, a Eletrobras e suas quatro controladas, Furnas, Chesf, Eletronorte e Eletrosul, e o restante oriundo de outras empresas associadas e de ensaios laboratoriais, projetos de pesquisa e serviços tecnológicos prestados a agentes do setor elétrico.

O Centro é formado por pesquisadores e técnicos de laboratórios. 50% deles têm títulos de mestres e/ou doutores. O Cepel chegou a ter 500 funcionários, mas com o desmonte que vem sendo provocado nos últimos cinco anos, hoje funciona com apenas 280 pesquisadores e técnicos.

“Temos menos gente e menos dinheiro e a cada dia mais serviço”, critica o pesquisador do Cepel, Antonio Carlos de Barros Neiva.

O Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica (Procel)

O Procel foi criado em 1985 pelo governo federal e é executado pela Eletrobras. O programa é voltado para o aumento da eficiência de equipamentos e serviços, para a disseminação de conhecimento sobre o uso eficiente da energia e para a adoção de hábitos de consumo mais conscientes. Dessa forma, contribui para postergar investimentos no setor elétrico, reduzir emissões de gases de efeito estufa e mitigar impactos ambientais, colaborando para um mundo mais sustentável.

O já conhecido “selo Procel” de eficiência é encontrado em eletrodomésticos vendidos no mercado. As alterações propostas para o estatuto da Eletrobrás ameaçam o Procel, afetando os consumidores e o meio ambiente.



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