Bala perdida atinge universitária em Fortaleza

Nádia deu entrada naquele hospital depois de ter sofrido um tiro na nuca

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A Polícia Civil já tem seguras informações de que foi um policial o responsável pelo disparo de revólver ou pistola que atingiu a estudante universitária Francisca Nádia Nascimento Brito, 22, aluna do curso de História da Universidade Estadual do Ceará (Uece). Até o começo da madrugada de hoje, Nádia permanecia internada, em estado gravíssimo, na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Instituto Doutor José Frota (IJF-Centro).

Nádia deu entrada naquele hospital depois de ter sofrido um tiro na nuca. A bala continua alojada no crânio. Até o fim da tarde, Nádia estava sob observação na Sala de Ressuscitação (Risco 1) mas, no começo da noite, foi transferida para a UTI. Ela respira com a ajuda de aparelhos.

Nádia foi mais uma vítima da violência sem trégua que atinge a Capital cearense. Ela saiu da sala de aula, no Campus do Itaperi, da Uece, por volta das 22 horas de quarta-feira. Acompanhada do namorado e de alguns amigos, a jovem lanchou na Praça da Cruz Grande, na Avenida Paranjana, bem perto da Universidade. Após o lanche, quando Nádia esperava o ônibus que a levaria de volta para casa, foi atingida pelo tiro que partiu de dentro de uma topique que retornava do Estádio Castelão, após a partida Fortaleza x Paraná.

Segundo apurou a Polícia, com o fim da partida de futebol, muitos torcedores ainda passavam em transportes coletivos pela Avenida Paranjana. Por volta das 23 horas, a topique onde estava o atirador passou pela praça e foi apedrejada por gangueiros que moram na Favela Garibaldi, localizada a poucos metros dali. Houve tumulto e o tiro foi disparado de dentro do transporte alternativo em direção ao grupo que lançava pedras. Mas a bala acabou atingindo a garota.

Desespero

Várias pessoas que estavam no local e moradores do entorno da praça socorreram a jovem. Ela foi levada ao Frotinha da Parangaba, mas, em decorrência da gravidade da lesão, acabou sendo transferida para o ´Frotão´.

?Sempre que tem jogo no Castelão acontece algazarra nessa praça. Um bando de delinqüentes fica apedrejando os ônibus e topiques. Ontem (anteontem), quando ouvi o tiro, fui para a janela e vi aquela moça caindo. Corremos todos para fora de casa e os amigos dela pediam para ela não morrer, enquanto ela perdia muito sangue?, contou uma testemunha, moradora do bairro.

A topique, de onde partiu o disparo, seguiu em frente, mas a Polícia acabou identificando o veículo horas depois.

O caso está sendo apurado pelo 5ºDP (Parangaba). Ontem pela manhã, a delegada Eliane Barbosa, que comanda as investigações, confirmou que o principal suspeito de ter atirado é um policial. ?Não podemos dizer mais, seria precipitado?, ressaltou.

A Uece, segundo o pró-reitor de Assuntos Estudantis, João Carlos Holanda, está prestando apoio à família de Nádia.

ESTRATÉGIA DA PM

Polícia ocupa a praça em dias de ?clássicos?

Não havia policiamento na Praça da Cruz Grande na noite da última quarta-feira, quando a estudante Nádia Brito foi atingida por uma bala perdida. Segundo o comandante do Policiamento da Capital, coronel PM Sérgio Costa, o local não é uma área de policiamento fixo dentro do planejamento da Polícia Militar.

?Colocamos policiamento lá quando obtemos informações no orkut ou dos serviços de inteligência da Polícia sobre a possibilidade de confronto entre torcidas adversárias e, principalmente, quando são realizados clássicos?, diz, lembrando que o jogo entre Fortaleza e Paraná era de uma torcida só. ?O fato de ontem (quarta-feira) poderia ter ocorrido em qualquer local?, lamenta.

O comandante explica que, como não havia qualquer evidência de conflito, o policiamento do jogo válido pela Copa do Brasil foi feito de forma móvel, com a participação de policiais do Batalhão de Choque, do Raio e de escolta a pé.

?Não tivemos nenhum problema de ordem de segurança nem antes nem depois do jogo, mas esta fatalidade?, diz. Segundo o coronel, o efetivo policial é dimensionado para os jogos de futebol de acordo com a carga de ingressos colocada à venda para o público.

Para o comandante, aumentar a quantidade de homens nas ruas não vai resolver o problema. Ele diz que o CPC já sugeriu medidas para a Procuradoria Geral de Justiça como a redução da carga de ingressos para as torcidas organizadas a cinco por cento do total e a penalização em um ano longe dos estádios para torcedores que se envolverem em conflitos.

?É preciso criar ferramentas para que as pessoas sintam que a baderna que elas promoverem trarão sérias conseqüências?, afirma o oficial.

AMEAÇA NAS RUAS

Crimes ocorrem fora dos estádios

É fora dos estádios que a violência envolvendo torcedores de futebol tem atingido conseqüências mais graves nos últimos anos. De 2003 para cá, pelo menos cinco pessoas foram mortas, em Fortaleza, em situações semelhantes ao caso da estudante da Uece, baleada na noite de quarta-feira.

Um dos episódios mais conhecidos aconteceu em outubro de 2003. Naquela ocasião, um torcedor do Ceará e outro do Paysandu foram mortos, a tiros, por membros de uma torcida organizada do Fortaleza dentro de uma oficina de serigrafia, no bairro Dionísio Torres. Em março de 2006, um torcedor do Ceará foi baleado por torcedores tricolores ao voltar a pé do Estádio Castelão para o Conjunto Palmeiras.

Em janeiro de 2008, um garoto de apenas 14 anos foi assassinado numa praça do Conjunto José Walter por torcedores do Ceará. O caso de morte mais recente foi a de um torcedor do América de Natal, atingido, a tiros, na CE-040, em Aquiraz, por torcedores do Ceará. O fato aconteceu em junho do ano passado e até agora os autores do homicídio não foram identificados.

Um apelo

Representantes da Uece fizeram um apelo para que as testemunhas do caso ocorrido na quarta-feira compareçam à Polícia para prestar informações. O pró-reitor de Administração, Luiz Carlos Mendes Dodt, lembrou que trafegar pela avenida Paranjana é sempre motivo de preocupação em dias de jogo no Castelão.

DESESPERO

Pais da jovem a encontraram quando ela chegava ao IJF

Enquanto a ambulância conduzia a universitária para o hospital de emergência, o telefone tocou na casa de dona Fátima Brito, mãe de Nádia. ?Era a Gisele, amiga dela, dizendo que tinha acontecido um acidente com minha filha. Eu e o pai dela fomos correndo para o IJF e chegamos praticamente juntos com a ambulância. Ainda consegui tocar na minha filha, ela estava desacordada e cheia de sangue no rosto´, lembrou Fátima.

Ontem pela manhã, ninguém estava na casa onde reside a família de Nádia. Filha única de dona Fátima e Antônio Fernando Cavalcante Brito, a jovem é muito querida pela vizinhança. ?Não estou acreditando nessa desgraça?, disse Nilza, vizinha da casa. Recentemente a estudante conseguiu um estágio no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura. ?Ela estava muito feliz, contando isso para todo mundo?, disse a mãe da estudante.

Os pais, acompanhados da madrinha de Nádia, Nereide Oliveira, e amigos, passaram o dia todo no IJF, aguardando notícias. A madrinha falou com carinho da afilhada. ?Ela é uma menina estudiosa, amável, educada, calma, criada com muito carinho. Tem medo da violência. O pai sempre vai buscá-la na parada do ônibus.?

SEM CONTROLE

Especialista diz que o clima nos jogos de futebol é de ´guerra´

Para o coordenador do Laboratório de Estudos da Violência (LEV) da Universidade Federal do Ceará (UFC), professor César Barreira, o comportamento violento das torcidas de futebol só será amenizado quando for resolvido o problema da violência na sociedade, pois os estádios acabam funcionando como ?catalisadores? desse tipo de comportamento. ?Existe todo um clima que antecede aos jogos e que leva à disputa de guerra?, analisa.

De acordo com o especialista, a questão deve ser trabalhada de maneira articulada, envolvendo o controle das torcidas organizadas e a punição aos criminosos. Para ele, é preciso articular projetos e ações da Segurança Pública e envolver a Imprensa.

Uma das explicações para a continuidade da violência é a impunidade dos responsáveis por esses atos. ?As pessoas calculam que tipo de procedimento podem ter e se vão ser punidas ou não?, explica. ?Um exemplo de punição que tem mudado ro comportamento dos torcedores é a imposição de perda de mando de campo aos clubes cuja torcida joga objetos no gramado?, diz Barreira.



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