Covid-19: Quarentena reduz dieta de crianças na periferia a arroz

A fome se espalhou antes que o Coronavírus pela periferia de São Paulo.

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A fome se espalhou antes que o Coronavírus pela periferia de São Paulo. Crianças acostumadas com até cinco refeições por dia na escola — hoje paralisadas devido à quarentena— têm dietas pobres que podem se resumir a arroz puro. As informações são da Folha de São Paulo.

Ao mesmo tempo que as aulas pararam, os pais dessas crianças, muito autônomos sem carteira assinada, perderam renda. Agora, passam o dia ouvindo pedidos dos filhos que não conseguem atender de iogurte a uma simples maçã.

As medidas de isolamento indicadas por especialistas para diminuir a curva de transmissão do coronavírus, foram mais ágeis que as ações de ajuda aos pobres.

Crédito: Leo Correa/AP

No Jardim Papai Noel, em Parelheiros (extremo sul), o baque foi sentidondesde o dia 23, quando escolas pararam. Depois, foi a vez do comércio e de outros estabelecimentos. Sem renda fixa, Rosangela da Silva, 36, se viu com mais cinco bocas, que antes faziam as refeições na escola, para alimentar. Ela mora na parte mais pobre de um bairro paupérrimo em um barraco de madeira com chão de terra, onde só se chega por uma trilha.

Os filhos dela, o mais novo com três anos, sentiram a mudança na alimentação. Diego, 7, enumera o que sente mais falta na escola: primeiro, o jogo de pebolim; depois, melancia, bolo, carne moída, pão com manteiga, tudo que não tem em casa. A geladeira está praticamente vazia, com uma panela de arroz, leite e um pote de margarina. Recentemente, Rosângela conseguiu comprar arroz e feijão. Mas nada de verduras, legumes, frutas, carne ou outra proteína animal.

"Às vezes a gente arruma algum pão dormido na padaria", diz ela. Na quartafeira (1º), foi vender chicletes próximo do Terminal Varginha, em Parelheiros. Após algumas horas no canteiro central, conseguiu alguns mantimentos e um pouco de dinheiro. A comida que conseguiu será feita num fogareiro improvisado com álcool, já que o gás acabou.

A cidade de São Paulo tem cerca de 618 mil famílias em situação de extrema pobreza (que vivem com menos de um quarto de salário mínimo), segundo dados mais recentes, de 2018. São famílias como a de Rosângela. Com o impacto do coronavírus, porém, muitos estão entrando no grupo.

Crédito: Matias Delacroix/AP

Sem emprego desde que a quarentena estourou, o pedreiro Márcio Pereira da Silva, 40, pai de seis filhos, é um deles. "Parou tudo, fecharam depósitos. A gente que trabalha de pedreiro depende do material do depósito. As pessoas também não querem mais que a gente entre na casa delas. Quem trabalha que nem eu, por conta, fica difícil. Se eu não sair um dia para trabalhar, não vou ter um real", diz.

Ele diz que já teve ocasiões em que a comida era arroz puro. "Ô bicho ruim, só com o tempero do sal mesmo." Sem gás, ele agradece quando tem o feijão como par do arroz. Tudo feito num fogão a carvão, improvisado por ele para substituir o gás.

O filho mais novo, de três anos, não se conforma com o novo cardápio. "Diz todo dia: 'Pai, eu quero danone. Pai, eu quero maçã'. Ontem bem cedo estava pedindo o quê? Morango! Eu digo: 'Ah, meu filho, você não tá na creche não, você tá em casa. Na creche você tinha essas coisas'", conta.

A dieta repetida, sem nutrientes, com diminuição da quantidade e qualidade, faz com que algumas dessas famílias entrem no grau de insegurança alimentar grave. "Embora possa não haver consenso sobre o tema, manifesto minha percepção: onde há insegurança alimentar, há fome", afirma Semíramis Martins Alvares Domene, professora de nutrição da Unifesp (campus Baixada Santista).



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