Covid-19: Conheça a história da 1ª vítima da fila de espera em SP

'Ele tinha gasto todas as economias nas bodas dos pais, mas a covid-19 o levou antes da festa'

rennan | arquivo Pessoal
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Por Camilla Veras Mota da BBC News Brasil em São Paulo

Seis dias separam o momento em que a primeira suspeita de que estivesse com covid-19 cruzou o pensamento de Renan Ribeiro Cardoso e sua morte. A prima Erica Marques Cardoso, que esteve com ele em cada etapa da peregrinação por quatro unidades de saúde em busca de atendimento, conta que "Nan" nunca conseguiu a tomografia dos pulmões de que precisava - nem o leito de UTI.

O jovem de 22 anos foi a primeira vítima na cidade de São Paulo da mórbida fila de espera por atendimento que resultou do aumento explosivo de casos da doença no Brasil. Apenas no mês de março, quase 500 morreram à espera de uma vaga de UTI no Estado. Ela lembra de chegar ao Pronto Atendimento em que ele estava, no bairro de São Mateus, na zona leste da capital, um dia antes de o primo falecer. Renan contou que tinha passado a noite inteira sentado em uma cadeira de rodas, transferido para uma cama franzina pela manhã.

O "balão" é o reservatório acoplado à máscara de oxigênio, um paliativo para a aguda falta de ar. A saturação de oxigênio na corrente sanguínea de Renan chegou a 50% - níveis abaixo de 94% já são sinais de alerta. A prima conta que ele não conseguia mais comer porque não suportava ficar sem o aparelho. Os médicos chamaram o pai de Renan para que ajudasse a virar o filho de bruços, em uma tentativa de aliviar um pouco a dificuldade de respirar.

Rennan e seus pais (Foto: Arquivo Pessoal)

Os médicos chamaram o pai de Renan para que ajudasse a virar o filho de bruços, em uma tentativa de aliviar um pouco a dificuldade de respirar. Seu Valmírio Cardoso e Erica foram então para casa. No dia 13 de março, cedinho, de volta ao PA São Mateus, ouviram Renan falando muito baixinho. Os médicos disseram que o quadro tinha agravado e que ele já estava no sistema CROSS, que administra a espera por vagas nos hospitais.

"Eu falei para ele: 'Você quer que eu escove seus dentes?'. Porque ele não conseguia nem levantar... Ele pegou e balançou a cabeça que não. Perguntei se ele queria água, dei água para ele. E falei: 'Então tá bom, eu estou indo embora e quando for quatro da tarde eu venho te ver de novo'". Renan se despediu dizendo: "Cuida da mãe pra mim, tá?" Quando ela e o tio voltaram à tarde, foi para receber a notícia de que chegaram a tentar intubá-lo, mas Renan não tinha resistido. Dezenove minutos depois, a vaga na UTI foi liberada em um hospital de campanha na zona sul.

Valmírio desatou o choro. Muito agitado, puxava os cabelos, "apertando a mão assim bem forte". O médico deu-lhe um calmante, mas ele repetia que queria ver Renan. Ao entrar para reconhecer o corpo, abriu os olhos fechados do único filho. A voz tomada pelo desespero pedia repetidamente que ele acordasse. A reportagem da BBC News Brasil esteve no PA São Mateus II três semanas depois da morte de Renan. Era uma manhã de quarta-feira ? e 20 pessoas aguardavam transferência para hospitais.

A família mora em um sobrado no bairro do Recanto Verde do Sol, em uma rua de casas conjugadas em que as vizinhas conversam pela varanda e os cachorros acompanham com interesse o vai e vem das motos. O térreo é hoje a pizzaria que Renan abriu com o pai em janeiro, a única fonte de renda da casa. Ele tinha gasto todas as economias planejando a boda de prata dos pais. A festa era pra ter acontecido em 2020, mas os planos foram postergados por causa da pandemia. A nova data era 14 de março ? a prima Erica veio de Minas no dia 22 de fevereiro para ajudar nos preparativos.

 Fonte: UOL



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