Por que o NE registra menor taxa de mortalidade pela Covid-19

Com medidas mais rígidas e uma comunicação mais forte do que em outras regiões, o Nordeste registra hoje a menor taxa de mortalidade pela covid-19.

higienização das mãos | Divulgação
FACEBOOK WHATSAPP TWITTER TELEGRAM MESSENGER

Em 2020, quando a pandemia começou a se alastrar no país, o Nordeste lançou um comitê científico para ajudar os governos a tomarem medidas de prevenção contra a covid-19. Lançaram campanhas em massa alertando sobre a necessidade de distanciamento, uso de máscara e álcool em gel. A região também foi a primeira a ter uma metrópole a realizar um lockdown —no caso, São Luís.

Com medidas mais rígidas e uma comunicação mais forte do que em outras regiões, o Nordeste registra hoje a menor taxa de mortalidade pela covid-19. Em 2021, por exemplo, essa taxa está em 49 por 100 mil habitantes, 37% menor do que a média nacional no mesmo período, que chega a 78 por 100 mil habitantes. No Sul, líder no índice, o número chega a 109 por 100 mil.

"O Nordeste hoje é quem puxa hoje a mortalidade do Brasil para baixo", diz André Longo, secretário de Saúde de Pernambuco e vice-presidente do Nordeste do Conass (Conselho Nacional de Secretários de Saúde).

Pessoa  higienizando as mãos com álcool 

A taxa de mortalidade do Nordeste na pandemia era de 134 por 100 mil na última quinta-feira (15). Os três estados com menores taxas de mortalidade na data eram do Nordeste: Maranhão (95 para cada 100 mil), Bahia (114) e Alagoas (117). A média nacional na data ficava em 174 para cada 100 mil pessoas.

Desde o início da pandemia, segundo os números oficiais do Ministério da Saúde, a região registrou até a quinta-feira 76 mil dos 365 mil óbitos —o equivalente a 21%.

Longo afirma que o resultado se deve, em partes, porque a região se articulou desde o início e ouviu mais a ciência. Mas ele reconhece que, mesmo com uma situação melhor que outras regiões, o cenário é crítico no Nordeste.

"A gente não comemora esses números. Mas precisamos reconhecer o esforço dos profissionais de saúde e dos governadores, que tiveram coragem de adotar medidas restritivas --que nem sempre têm uma repercussão positiva na população, mas precisavam ser adotadas. Além disso, ampliamos muito a capacidade hospitalar. Só aqui foram 540 leitos de UTI em 40 dias." disse André Longo, secretário de Saúde de Pernambuco e vice-presidente do Nordeste do Conass.

Quatro dos nove estados têm mais de 90% de ocupação de leitos de UTI (Unidade de Terapia Intensiva). 

Para a infectologista Ana Brito, da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) de Pernambuco, ainda é cedo para ter certeza de que os números se manterão tão abaixo da média nacional por conta do incerto pico da segunda onda da pandemia.

"Olhando para Manaus, a gente vê que teve um período de 45 dias até a explosão da epidemia. Mas pode ser que a gente já esteja entrando nesse tempo, mas é uma especulação. É preciso aguardar mais."

"Indiscutivelmente as medidas de restrição de circulação da população causam uma diminuição dos casos. O problema do Brasil é que a gente não fez medida restritiva de forma rigorosa. A gente aqui fez medidas parciais, mas, mesmo parciais, há uma resposta, embora mais tímida", completa.

Referência no país 

Salvador e Fortaleza, duas das cidades mais populosas da região, foram citadas como referência em medidas de restrição à circulação bem-sucedidas no último boletim da Fiocruz.

"Tendo como referência os decretos nacionais que estabelecem as atividades e serviços essenciais, bem como decretos municipais mais recentes de Fortaleza, Salvador e Araraquara (SP), cidades que se submeteram a restrições mais rígidas e que apresentaram decréscimo sustentado dos indicadores de criticidade da pandemia, apresentamos no alguns exemplos de atividades e serviços essenciais e não essenciais", diz documento da entidade.

Fortaleza decretou o fechamento dos serviços não essenciais em 5 de março, flexibilizando apenas questões pontuais até aqui. Já na Bahia, primeiramente houve fechamento de serviços não essenciais no último fim de semana de fevereiro, mas depois a medida foi esticada para todos os dias da semana em março.

Nos demais estados, todos adotaram algumas medidas restritivas, como toque de recolher, suspensão de eventos, fechamento de bares e restaurantes e restrição de horários de atividades não essenciais.

A revista científica The Lancet afirmou ainda que o Nordeste é o melhor exemplo de medidas restritivas com sucesso no país, mesmo sendo uma área com grande vulnerabilidade social.

A médica e pesquisadora Fernanda Grassi, da Fiocruz da Bahia, ressalta que o resultado do Nordeste chama ainda mais a atenção porque a região tem uma disponibilidade de leitos de UTI menor que Sul e Sudeste.

"Essa menor mortalidade deve estar relacionada à postura adotada pelos governos, que desde muito cedo criaram um comitê científico com pessoas de grande experiência no controle de epidemias. Houve, sem dúvida, uma maior busca de seguir a OMS (Organização Mundial da Saúde) para mitigar essa epidemia, com campanhas educativas", destaca.

O epidemiologista Antônio Lima Neto, da Unifor (Universidade de Fortaleza), afirma que, como a epidemia ainda está em curso, não há como cravar que a região não verá um crescimento de casos e óbitos. Entretanto, com as medidas já adotadas, a região deve ter uma redução na transmissibilidade do novo coronavírus.

"O impacto das medidas restritivas para uma epidemia é um pouco mais tardia, demora mais a acontecer", afirma.

Nordeste errou menos 

O neurocientista Miguel Nicolelis chegou a coordenar o comitê científico do Nordeste em 2020 e início de 2021. Ele deixou o cargo em fevereiro , após o aumento de casos. À época, os governos estaduais não seguiram orientações dos especialistas para fechamento de serviços não essenciais.

"Diria que os governos cometeram erros, mas o Nordeste errou bem menos", diz. "É como uma turma em que ninguém passou de ano, mas os governos nordestinos tiveram a melhor nota da sala", compara. 

Para Nicolelis, a região colhe ainda bons frutos das medidas adotadas na primeira onda. 

"A mensagem passada da gravidade da pandemia foi bem maior, os governos alertaram mais, o que não ocorreu de forma tão explícita em nível nacional. Sem dúvida foi a região menos negacionista do país." disse Miguel Nicolelis, neurocientista e pesquisador.

O pesquisador ainda lembra que, na primeira onda, os governos seguiram mais as recomendações científicas e colheram frutos disso. "Tivemos lockdowns bem sucedidos, começando por São Luís, depois Fortaleza, a Grande Recife e João Pessoa. Os resultados foram bons. Em São Luís, por exemplo, os efeitos positivos foram sentidos por quatro meses e levaram o Maranhão a ter menor taxa de óbito do país", cita, lembrando medidas como modelo para o país.

"Ações como a criação de brigadas de saúde no Piauí e a suspensão do transporte intermunicipal na Bahia foram boas, tiveram grande impacto e reduziram o poder letal da pandemia", diz.

Mortalidade por 100 mil habitantes por região em toda a pandemia 

Nordeste - 134 

Sul - 184 

Sudeste - 186 

Norte - 191 

Centro-Oeste - 210

Mortalidade por 100 mil habitantes por região em 2021: 

Nordeste - 49 

Sudeste - 81 

Norte - 91 

Centro-Oeste - 96 

Sul - 107



Participe de nossa comunidade no WhatsApp, clicando nesse link

Entre em nosso canal do Telegram, clique neste link

Baixe nosso app no Android, clique neste link

Baixe nosso app no Iphone, clique neste link


Tópicos
SEÇÕES