“Deus mandou”, disse pastor sobre mulher morta queimada na fogueira

O grupo acreditava que a mulher estava “possuída pelo demônio”

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A Polícia Nacional da Nicarágua apresentou, na tarde de terça-feira, cinco membros de um grupo de fanáticos religiosos acusados de queimar uma mulher na fogueira por acreditar que estava “possuída pelo demônio”. O líder do grupo, Juan Gregorio Rocha, que se identifica como pastor da congregação evangélica Assembleia de Deus, declarou no momento da prisão que “Deus disse que ia tirar aquele espírito maligno dela e mandou acendermos uma fogueirinha para expulsar o demônio.” O fato comoveu a Nicarágua, país onde 345 mulheres foram assassinadas desde 2012.

Entre os cinco detidos há duas mulheres, Estrella del Socorro Orozcso e Tomasa Rocha Romero. Segundo testemunhas, elas teriam participado da morte da jovem Vilma Trujillo García, de 25 anos, na comunidade El Cortezal, no município de Rosita, um povoado remoto na região do Caribe nicaraguense.

O suposto pastor Gregorio Rocha disse à imprensa que a jovem caiu na fogueira “quando o Espírito Santo saiu de seu corpo” e justificou a ação como um procedimento de “cura” da mulher que, segundo o grupo religioso, estava “endemoniada”. A jovem foi despida e lançada ao fogo com as mãos amarradas. Em seguida, segundo testemunhas, ela foi atirada “em um barranco”, onde permaneceu nove horas até ser encontrada por um familiar. Vilma Trujillo García sofreu queimaduras severas em 80% do corpo e faleceu na madrugada de terça-feira em um hospital de Manágua.

O marido da jovem, Reynaldo Peralta, relatou à imprensa local que estava ausente do povoado durante quinze dias porque ajudava a mãe, que mora em outra localidade, na construção de sua casa. O homem disse que a esposa, mãe de dois filhos, sofria “problemas de saúde e desmaios”, por isso os familiares procuraram a ajuda da congregação religiosa. Foi Gregorio Rocha quem decretou que a mulher estava “endemoniada” e que ele sua congregação a curariam.

A Assembleia de Deus é um grupo evangélico pentecostal criado em 1914 nos Estados Unidos e hoje presente em vários países. O grupo religioso conta com 12.000 membros na Nicarágua e mais de 64 milhões de pessoas no mundo inteiro, segundo números fornecidos pela própria instituição.

Em declaração feita na terça-feira, o pastor Rafael Aristas, presidente da congregação na Nicarágua, distanciou-se da morte da jovem Trujillo na fogueira. Aristas afirmou que Gregorio Rocha não está registrado como pastor na Assembleia de Deus, mas confirmou que o homem de 23 anos é evangélico.

O fato comoveu a sociedade nicaraguense. Personalidades da vida política, cultural e religiosa do país expressaram indignação pela morte da Vilma Trujillo. Em seu pronunciamento diário nos meios de comunicação, a vice-presidenta Rosário Murillo disse que o fato é “realmente lamentável, uma irmã que foi martirizada por membros de sua comunidade, algo que não pode e não deve se repetir”. Grupos feministas da Nicarágua acusam Murillo de manipular a religião em seu discurso oficial para ganhar o apoio da população de um país conservador e profundamente religioso.

Silvio Báez, bispo auxiliar de Manágua e considerado o número dois da Igreja católica na Nicarágua, disse em sua conta no Twitter: “Sinto muito pela morte de Vilma Trujillo por causa do fanatismo e da ignorância religiosa. Não se pode destruir uma vida em nome de Deus!”

A escritora Gioconda Belli também expressou sua indignação nas redes sociais. Em sua conta do Twitter afirmou que “esse crime atroz não pode ficar impune. Como também o de tantas mulheres cujos cadáveres se acumulam enquanto reina a impunidade”. Belli se declarou “comovida” pelo assassinato cruel de Vilma Trujillo, “queimada como nos piores tempos da Inquisição e da Caça às Bruxas”.

Os cinco detidos pela Polícia da Nicarágua foram levados a Manágua, onde responderão a processo judicial. O corpo de Vilma Trujillo García chegou na noite de terça-feira a El Cortezal, e será enterrado na mesma comunidade onde ela foi queimada viva.



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