Análise: governo não consegue mais agradar mercado e elevar gasto; saiba

O dinheiro que o governo federal tira do orçamento para pagar juros passou de R$ 59 bilhões em 2002 para R$ 92 bilhões em 2010

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Os protestos se espalham pelo Brasil num momento em que o governo já não consegue mais agradar o mercado, manter o ritmo de expansão dos gastos sociais e ainda acomodar no orçamento as demandas da ampla coligação de partidos aliados, modelo que marcou os oito anos da administração Lula.

O dinheiro que o governo federal tira do orçamento para pagar juros passou de R$ 59 bilhões em 2002 para R$ 92 bilhões em 2010 (valores corrigidos pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo, como os demais deste texto). A inflação anual caiu de 12,5% para 5,84% no mesmo período.

Enquanto isso, o câmbio oscilou sem grandes solavancos, com exceção de 2008, quando estourou a crise bancária dos Estados Unidos.

Esses três pontos ? reserva de dinheiro para juros, inflação na meta e câmbio flutuante ? são a receita básica para um governo se manter em paz com o mercado, ou seja, com bancos e grandes investidores.

Paralelamente, o governo subsidia empresários. Toma dinheiro emprestado no mercado a juros altos e empresta a companhias a juros mais baixos, por meio do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). Os desembolsos dessa instituição passaram de R$ 69 bilhões em 2002 para R$ 197 bilhões em 2010.

Investimento social

Mesmo agradando banqueiros e empresários, o governo Lula conseguiu colocar dinheiro na a área social.

O orçamento do programa Bolsa Família avançou de R$ 6 bilhões em 2003 para R$ 17 bilhões em 2010. O do Ministério da Saúde, de R$ 45 bilhões para R$ 70 bilhões; o da Educação, de R$ 42 bilhões para R$ 82 bilhões (sempre em valores atualizados pelo IPCA).

Ainda, o salário mínimo subiu 155% no governo Lula, bem acima da inflação, que foi de 60%.

Com dinheiro para bancos, empresas e para a área social, Lula deixou a presidência e 1º de janeiro de 2011 com aprovação de 87%, um recorde mundial.

Chuva de dólares

Esse dinheiro todo começou a chegar ao Brasil pelas exportações. Produtos básicos, o ponto forte do país, ficaram mais caros no mercado internacional, em grande parte por causa do crescimento econômico da China. A venda de soja e de carne bovina ao exterior sextuplicou de 2001 a 2011, em valores. A do minério de ferro aumentou 14 vezes.

A entrada de dólares no Brasil, combinada com a disciplina do governo para pagar juros e controlar a inflação, animou investidores estrangeiros, que quintuplicaram seus aportes anuais no país na era Lula.

Ao mesmo tempo em que chegava dinheiro do exterior, o mercado interno crescia e gerava empregos formais e aumento de renda. Consequentemente, a arrecadação de impostos também subiu.

Maus ventos

Hoje, a China já não cresce mais como antes, e a Europa, um dos grandes importadores de mercadorias brasileiras, não sai da crise.

Com isso, os produtos básicos ficaram mais baratos no mercado internacional. As exportações de minério de ferro, por exemplo, diminuíram 25% em 2012. Os investimentos estrangeiros diretos não caíram, mas também não subiram.

O emprego e a renda continuam em patamar historicamente alto. Mas, como a produtividade das empresas não aumentou na mesma proporção, a margem de lucro, especialmente da indústria, ficou prejudicada no ano passado. Investir na produção deixou de ser tão atraente.

Menos dinheiro

O consumo se mantém forte. Sem novos investimentos, no entanto, gera inflação. Contra isso, o Banco Central aplica seu remédio tradicional, que é o aumento de juros, o que significa mais despesas para o setor público.

O governo tentou reduzir o custo das empresas cortando tributos sobre a folha de pagamento. Porém, a economia está demorando para reagir, o que gera queda de arrecadação de impostos. União, Estados e municípios ficam com menos dinheiro.

Nessas condições, o poder público não consegue mais agradar o setor financeiro e os grandes empresários ao mesmo tempo em que aumenta investimentos na área social.

Partidos

Enquanto o governo atendia a todos, os partidos foram ficando mais parecidos. Quem era pró-mercado prometeu aumentar o Bolsa Família e teve vergonha de defender privatizações. Quem tinha histórico mais socialista seguiu uma política monetária ortodoxa.

O eleitor possivelmente se confundiu com isso nesses anos todos, mas a economia ia bem. Agora que não há mais dinheiro público sobrando, os partidos terão que definir melhor de que lado estão.

Falando nisso, uma palavra sobre os atos. É notável que tem se difundido entre os manifestantes, com força e agressividade, uma visão antipartidária da política. Não me parece uma postura democrática.

Impedir que partidos se expressem é típico de ditaduras. Engana-se quem pensa que pode haver democracia sem liberdade de expressão e de associação. Não existem hoje sistemas políticos sem partidos. Se achar que viu algum, é porque se trata de sistema de partido único, ou seja, é uma ditadura.



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