Prêmio Piauí Inclusão Social 2013: Presos trabalham e têm redução de suas penas

A montagem de rodas de bicicleta que serão vendidas em todo o país é o meio utilizado por detentos para conseguir se reinserir na sociedade

Detentos montam bicicletas, ganham dinheiro e ainda conseguem reduzir suas penas | Dayne Dantas
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As mãos rápidas usam uma ferramenta circular de forma ágil. Em instantes, todos os raios estão fixados na roda de bicicleta. A mão esquerda traz uma luva, que ajuda e dá segurança no manuseio das peças. Os movimentos são naturais, mas bastante precisos. Esse é o resultado da prática adquirida em dois anos de trabalho por José Wilson Bacelar, detento da penitenciária Irmão Guido, em Teresina. Ele é um dos participantes do projeto ?Pedalando para a liberdade?, uma parceria da Secretaria Estadual de Justiça e da Houston Bike.

O projeto funciona através de uma relação na qual todos têm papéis bem definidos: a Houston Bike envia as peças para a montagem de rodas de bicicletas no próprio presídio. Os detentos trabalham no preenchimento de cubos e no alinhamento/enraiamento das rodas, recebendo de acordo com a produção alcançada. Além disso, há o benefício da remissão de pena ? a cada três dias trabalhados, um dia a menos na prisão.

Depois de produzidas, as rodas saem do presídio e seguem direto para a matriz da Houston ? e de lá para todo o país, nas bicicletas produzidas pela marca. A média diária de produção alcançada pelos detentos é de 300 pares de rodas.

Sem interromper o serviço, José Wilson conversou com a reportagem da Rede Meio Norte e do Jornal MN. Em meio às ferramentas de trabalho, ele falou um pouco sobre a experiência de participar da atividade.

?Tenho a oportunidade de ter um novo pensamento. Com isso, mostro para as autoridades que não sou uma pessoa má?, resumiu o rapaz ? adiantando que já tem contatos para continuar exercendo a atividade quando deixar a prisão.

?São pessoas que me veem com bons olhos e que me darão uma oportunidade?, diz ele, que está na unidade prisional há dois anos, um mês e sete dias, nas contas do próprio José Wilson.

E ele não é o único satisfeito com os resultados do projeto, que existe na Irmão Guido há nove anos. Para a diretora de humanização e reintegração social da Sejus, Rosângela Queiroz, o Pedalando para a Liberdade representa uma estratégia consolidada no sentido de promover a reinserção dos presos na sociedade.

?Além da remissão de pena e da remuneração, há também o efeito psicológico. Com o trabalho, os detentos lidam melhor com a pena restritiva de liberdade?. O diretor da unidade prisional, capitão Paulo Oliveira, segue a mesma linha de pensamento. ?A reincidência da prática de crimes é muito menor nos participantes desse projeto. O detento que trabalha na montagem de rodas tem muito mais facilidade para obter os benefícios que a lei penal prevê?, ressaltou o diretor.

Preso há 11 meses na penitenciária Irmão Guido, o detento José Florêncio orgulha-se de ter aprendido as técnicas de montagem de rodas em apenas uma semana. Tímido, ele elenca os benefícios de trabalhar diariamente no projeto.

?Eu não gosto de ficar parado. Me sinto mal, sabe? Aqui eu respeito todo mundo e todo mundo me respeita. É muito bom poder trabalhar. Hoje eu sei enraiar, desempenar, faço de tudo?.

Detentos conseguem superar máquinas

A Houston Bike também produz rodas em suas modernas instalações, de forma mecanizada. Mas o trabalho manual dos detentos no ?Pedalando Para a Liberdade? tem mais precisão, dando origem a rodas ainda mais caprichadas.

Quem assina embaixo é José Luiz Cavalcante, gerente industrial da Houston Bike. ?É muito importante para nós, da Houston, poder participar deste projeto. É uma forma que a empresa encontrou para prestar serviços à sociedade ? e essa espírito de trabalho social é imprescindível para qualquer grande empresa?, conta Cavalcante.

O gerente ressalta que à Houston cabe a função essencial de ceder o material, e que a administração da Irmão Guido seleciona os detentos que participam do projeto (pertencentes ao pavilhão A, onde ficam os presos de bom comportamento). Além disso, a equipe da unidade prisional fixa os detalhes da rotina de produção, como o horário das atividades.

Toda uma estrutura foi montada no presídio para que o trabalho se dê com total eficiência. Nas cercanias do pavilhão A, uma rampa especial foi construída para facilitar o descarregamento de materiais e o carregamento das rodas prontas. Um pequeno galpão abriga os insumos de produção estocados e serve de local de trabalho para o eficiente time que trabalha na montagem das rodas. Tudo, enfim, pensado para otimizar os resultados.

?Sairei purificado?

Na ponta final da linha de trabalho que o ?Pedalando para a liberdade? instalou na penitenciária Irmão Guido, um homem atento faz um trabalho minucioso. Confere os racks (estruturas que acomodam as rodas para o transporte, depois de prontas), anota os modelos, a quantidade, a data e o emitente. Afixa etiquetas e garante que nada saia do controle. Essa é a rotina do detento José de Jesus ? o seu Dedé.

Ele é uma espécie de coordenador do trabalho final de produção das rodas de bicicleta, e o correto encaminhamento dos itens depende do gerenciamento dele. Com isso, acabou assumindo uma aura de liderança dentro das tarefas do projeto. Dedé conta um pouco de sua história.

?Antes de vir para cá (para a penitenciária) eu era comerciante. Infelizmente me iludi com o crime, mas isso já passou. Hoje, estou feliz por fazer o que faço com esse trabalho. Estou me reabilitando a trabalhar, e tenho a certeza de que, através desse projeto, sairei daqui purificado, renovado?, conta o homem de palavras pausadas.

A proposta de inclusão do ?Pedalando? foi tão bem aceita pelos detentos que já há até fila de espera para a participação nos trabalho de montagem de rodas. Além disso, o próprio tempo de funcionamento da iniciativa ? nove anos- atesta o sucesso desta importante proposta de ressocialização e promoção da cidadania.

Trabalho ?olho no olho?

A coordenação do ?Pedalando para a liberdade? está a cargo do agente penitenciário Reginaldo Coutinho Carvalho. Ele dá detalhes de como é conviver com os presos, organizando a produção, fiscalizando os serviços e ajudando todos a melhorar os resultados.

?Eu os observo muito. Converso bastante com eles, e acabo aprendendo também com essas experiências. O projeto tem a grande vantagem de tirar a ociosidade e reeducar ao mesmo tempo, o que é um grande acerto?, diz Carvalho. O agente complementa ressaltando o sentimento de trabalhar em um projeto como este. ?É um orgulho para mim desempenhar essa atividade, fazer parte de tudo isso. É um trabalho que faço com muito gosto?, finalizou, com um sorriso no rosto.



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