‘Sommelier de vacina’: selecionar fabricante pode atrasar vacinação

Pfizer é a mais buscada: brasileiros rejeitam a AstraZeneca por medo de trombose e a CoronaVac por sua não aceitação em países da Europa e nos EUA

Vacina | Sérgio Lima/Poder360
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A prática de buscar vacinas específicas em postos de saúde irradiou para grupos de WhatsApp e Facebook em que pessoas interessadas em receber Pfizer e, mais recentemente, Johnson, pedem orientações de onde achar os imunizantes.

São os famosos sommeliers de vacina. Em um grupo no Facebook, com pouco mais de 300 membros, há dicas sobre onde há doses da fabricante americana no Rio ou em São Paulo. Normalmente, quem passa as informações são pessoas que foram aos postos e encontraram lá os imunizantes para aplicação.

Procura por vacinas específicas atrasa campanha de vacinação (Foto: Sérgio Lima/Poder360)

Carolina Loureiro, de 44 anos, pesquisou na internet e visitou dois pontos de aplicação de vacinas antes de encontrar a dose da Pfizer/BioNTech no Instituto Vital Brazil, em Niterói. A preferência pelo imunizante americano-alemão, explica ela, é por ter histórico de trombose.

Já o empresário Thiago Sodré, de 39 anos, rodou mais de dez pontos de vacinação — entre Barra, Zona Sul e Niterói — atrás do imunizante da Pfizer.

Após duas semanas de buscas, ele, que é diabético e tem medo de ter trombose por causa das complicações circulatórias da doença crônica, aceitou tomar a AstraZeneca no posto montado na Cidade das Artes, na Barra. Para sua felicidade, como reação sentiu apenas dor no braço e calafrios à noite.

Procura

Uma administradora que pediu para não ser identificada já foi a cinco postos para tentar receber a primeira dose, mas não se vacinou por não ter encontrado o imunizante que desejava.

A preferência dela pela Pfizer também está relacionada ao histórico de trombose. Nos postos que visitou, encontrou AstraZeneca, Johnson e CoronaVac, esta última reservada para gestantes.

“Agendei uma consulta com minha cirurgiã vascular para conversar sobre tomar essas duas outras vacinas e ver se tem algo que eu possa fazer para tentar minimizar os riscos. Mas, enquanto isso, vou continuar aguardando se aparece a Pfizer em algum lugar”.

Casos de trombose

Casos de trombose após aplicação de doses da AstraZeneca e da Johnson já foram relatados em alguns países da Europa, nos EUA e no Brasil. No entanto, os episódios são muito raros, cerca de 1 em cada 500 mil doses aplicadas, em média.

Porém, o desenvolvimento de uma trombose não é sentença de morte, alerta a epidemiologista Ethel Maciel. Como a incidência é baixa, não é preciso sentir medo, apenas saber reconhecer os sintomas, caso eles apareçam — como dor, inchaço e vermelhidão nas pernas, dificuldade de respirar ou visão turva — e buscar imediatamente um atendimento de pronto-socorro para fazer o tratamento.

“As pessoas devem aceitar a vacina que está disponível naquele momento, porque é assim que vamos sair desta pandemia, alcançando o maior número de pessoas vacinadas. Todos os imunizantes disponíveis no Brasil são seguros. Eu já tive trombose e tomei AstraZeneca. Não tive nenhum problema”, diz a especialista.

AstraZeneca e CoronaVac

A vacina da AstraZeneca não está sendo aplicada, no Brasil, apenas em gestantes e puérperas, porque a gravidez já é um fator de risco (maior que a vacina) para o desenvolvimento de trombose.

Já a CoronaVac ainda não é aceita na Europa nem nos EUA, apesar de já ter sido aprovada para uso emergencial pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Por isso, ela é rechaçada por quem deseja fazer viagens internacionais.

Não há queixas

O secretário-executivo Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), Mauro Junqueira, afirma ter ouvido relatos, principalmente pela imprensa, de pessoas que querem escolher qual vacina tomar, mas diz que essa não tem sido uma queixa dos municípios ao conselho.

“A orientação aos municípios é vacinar. Todas as vacinas que estão sendo distribuídas foram aprovadas e são de boa qualidade, protegem a vida do cidadão. Quem quer escolher que vá para o final da fila. Mas temos tido a tranquilidade de abrir e rapidamente acabar a vacina. É sinal de que a população está procurando, e está sendo imunizada”.

Junqueira destaca ser temerário que, “num cenário de agravamento com número de mortes em patamar alto”, uma pessoa seja chamada para se vacinar mas não compareça por ser de determinada fabricante. Ele acrescenta que cada município tem suas especificidades, e os gestores têm autonomia para adotar medidas com objetivo de coibir essa situação, caso necessário.

“Se as pessoas quiserem escolher qual marca tomar, isso pode atrasar a campanha”.

Estratégias das capitais

A Secretaria municipal de Saúde do Rio confirmou que a prática é observada por parte das pessoas que vão às unidades de saúde da cidade — e divulgou um apelo: “Deixar de se vacinar por preferir outra marca é um equívoco que retarda sua proteção contra o coronavírus e contra a gravidade da Covid-19”.

Para evitar a prática, a prefeitura de Belo Horizonte garante que cada faixa etária receba uma vacina específica. Por exemplo, pessoas com 52 anos são elegíveis apenas à CoronaVac, independentemente do posto de saúde onde ocorre a imunização. Quem se recusar a tomar a vacina elencada para sua faixa etária não recebe outro imunizante e, portanto, fica sem se vacinar.

Em Porto Alegre, os “sommeliers” são responsáveis por reduzir em 30% a movimentação em unidades de saúde quando a vacina distribuída no local é a do Instituto Butantan, a mais rejeitada entre os moradores.

Para desencorajar esse comportamento, o município deixou de divulgar em sua conta no Instagram quais os fabricantes das doses a serem utilizadas naquela semana. A capital gaúcha também digitalizou totalmente os cadastros de pessoas vacinadas para um sistema on-line.

A ficha consultada pelo computador, na hora da aplicação, evita um tipo de fraude capitaneado pelos “selecionadores”.

“Algumas pessoas que tomaram a CoronaVac há três meses não queriam receber a segunda dose do mesmo imunizante, mas sim começar um novo esquema vacinal com a Pfizer”, explica João Manoel Assunção, diretor adjunto da Secretaria de Saúde local.



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