Receita Federal revela 'caixa-preta' das 26 empresas que abocanham R$ 100 Bi do governo

As organizações foram beneficiadas com pelo menos R$ 1 bilhão em incentivos fiscais concedidos pelo governo Bolsonaro em 2021

26 empresas concentram 46% dos benefícios fiscais federais | Sergio Moraes/REUTERS
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Um total de 26 empresas foi beneficiado com pelo menos R$ 1 bilhão em incentivos fiscais concedidos pelo governo federal em 2021, resultando em um montante aproximado de R$ 100 bilhões em impostos não arrecadados, de acordo com informações reveladas pelos dados da "caixa-preta" das renúncias fiscais da Receita Federal deste ano. Os números relativos a 2022 ainda não foram divulgados.

Os incentivos fiscais alcançaram a cifra de R$ 215 bilhões em 2021, sendo concedidos a um total de 24 mil empresas, incluindo isenções de impostos federais, como IPI, Imposto de Importação, PIS, Cofins, além de deduções relacionadas ao Prouni, à Zona Franca de Manaus, isenções para atividades na Amazônia e no Nordeste, entre outros.

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Vinte e seis empresas se destacaram ao receberem isenções superiores a R$ 1 bilhão cada uma, totalizando um valor combinado de R$ 99 bilhões, representando quase a metade do total dos benefícios fiscais concedidos às empresas naquele ano.

A divulgação dessas informações é uma resposta a uma demanda do ministro da Fazenda e busca trazer maior transparência às isenções fiscais, encerrando a chamada "caixa-preta das renúncias fiscais". A Receita Federal tornou públicos os dados referentes às organizações beneficiadas com isenções fiscais federais em 2021, que foram disponibilizados por meio de cinco tabelas, publicadas entre maio e junho.

Contudo, vale ressaltar que os números divulgados abrangem apenas uma parte dos benefícios fiscais, excluindo, por exemplo, os benefícios concedidos em nível estadual, como isenções de ICMS. De acordo com a Unafisco (Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil), o governo abrirá mão de R$ 641 bilhões em impostos em 2023.

Fatias da petroleira

As empresas que receberam os maiores benefícios foram a Petrobras, com R$ 29 bilhões, e a Vale, com R$ 19 bilhões, ambas sendo duas das três maiores empresas de capital aberto do país em termos de faturamento, sendo a terceira a JBS. No entanto, é importante destacar que os benefícios fiscais não estão diretamente relacionados à receita das empresas, sendo necessários atender a critérios setoriais, tipos de operações ou estar localizado em regiões que se beneficiem de incentivos.

Dentre os programas que geraram os maiores incentivos estão aqueles voltados para o comércio exterior e os incentivos destinados à Amazônia e ao Nordeste. Os setores que mais se destacaram em termos de benefícios fiscais incluem petróleo, mineração, aviação, montadoras de veículos, máquinas e insumos agrícolas, bem como tecnologia. Além disso, órgãos públicos, como o Ministério da Saúde, também figuram entre os beneficiários.

Declínio com a sanção da reforma tributária

Vale observar que uma parte significativa desses benefícios está relacionada a impostos que serão eliminados com a reforma tributária em andamento. Essa reforma prevê a extinção de três impostos federais: PIS, Cofins e IPI, e os benefícios vinculados a esses impostos somaram R$ 115,4 bilhões. Com a eliminação desses impostos, muitos dos benefícios a eles associados também devem cessar, de acordo com Rodrigo Orair, diretor de Programa da Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária.

No entanto, é importante ressaltar que parte substancial desses incentivos permanecerá inalterada após a reforma, já que a mesma não afeta o Imposto de Importação, que totalizou R$ 48,7 bilhões em benefícios fiscais, nem as deduções do Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ). Um exemplo disso é a redução de 75% no IRPJ para projetos na Amazônia e no Nordeste, que gerou R$ 41 bilhões em isenções.

A lista de tributos que deixaram de ser pagos em 2021 inclui o Cofins, com R$ 77 bilhões, o Imposto de Importação, com R$ 48,7 bilhões, a redução de 75% no IRPJ para projetos na Amazônia e no Nordeste, com R$ 41 bilhões, o IPI, com R$ 21,6 bilhões, e o PIS, com R$ 16,8 bilhões.

A divulgação desses dados tem o propósito de tornar mais transparentes os benefícios fiscais. O acesso a essas informações permite à sociedade avaliar a eficácia desses incentivos e se eles trazem os resultados esperados, segundo Eduardo Fleury, especialista em direito tributário e sócio do FCR Law.

Com a reforma tributária em andamento, a transparência aumentará e as distorções do atual modelo deverão ser reduzidas. Alguns dos benefícios fiscais foram criados com o objetivo de garantir a não cumulatividade de impostos, mas ao longo do tempo ocorreram distorções que fizeram com que algumas empresas recebessem mais benefícios do que o necessário, enquanto outras receberam menos, como destacado por Fleury. A reforma visa corrigir essa situação, permitindo que as empresas utilizem créditos fiscais presentes nas notas fiscais.

Outros incentivos fiscais terão que ser incorporados ao orçamento. O texto da reforma tributária proíbe a concessão de incentivos fiscais via impostos, com exceções estabelecidas na própria reforma. Isso significa que, se o governo federal ou os governos estaduais desejarem incentivar uma empresa, o incentivo deverá ser fornecido na forma de recursos financeiros incluídos no orçamento, aumentando a transparência dos benefícios, de acordo com Fleury.

Outros atributos do projeto

Além disso, a reforma tributária busca limitar o uso do imposto como instrumento de incentivo, uma vez que o incentivo via imposto sobre produtos pode criar distorções de preços que afetam a decisão de compra dos consumidores, como aponta Eduardo Fleury.

Os benefícios concedidos a empresas localizadas na Amazônia e no Nordeste destacam-se entre os mais relevantes. A política que permite a redução de 75% no IRPJ para essas empresas resultou em um gasto tributário de R$ 41 bilhões em 2021, sendo cerca de 40% desse valor destinado à mineradora Vale e sua subsidiária Salobo Metais. Além disso, os benefícios para empresas na Zona Franca de Manaus também são substanciais e beneficiaram empresas como Samsung e LG.

Para especialistas em tributação, é fundamental avaliar se as atividades seriam viáveis sem esses benefícios. Por exemplo, no caso da Vale, cujas operações estão localizadas no Pará, a pergunta relevante é se essa atividade seria viável sem os incentivos fiscais. Isso levanta a questão da vantagem comparativa do Brasil nesse setor e se os incentivos são realmente necessários, como ressalta Fleury.

As isenções relacionadas a importações e exportações também representam um custo significativo. Apenas uma das categorias que trata dos regimes aduaneiros especiais resultou na não arrecadação de R$ 35 bilhões. O regime Recof, que suspende impostos sobre mercadorias destinadas à exportação após passarem por processos de industrialização no Brasil, gerou um custo de R$ 16 bilhões. Com a reforma tributária, muitos desses benefícios perdem sua relevância, uma vez que esses regimes especiais foram criados para corrigir distorções do sistema atual, como destaca Rodrigo Orair, diretor de Programa da Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária do Ministério da Fazenda.

Diversas montadoras de veículos e empresas do setor de aviação estão entre as 26 empresas que receberam mais de R$ 1 bilhão em benefícios fiscais. Isso inclui empresas como Fiat, General Motors, Volkswagen, Mercedes-Benz, Scania, Renault e Volvo no setor automotivo, e GE Celma, Latam, Gol, TAP Manutenção e Embraer (Yaborã) no setor de aviação. Os principais benefícios desses setores estão relacionados a isenções voltadas para importação e exportação.

No entanto, especialistas destacam que é necessário uma análise criteriosa por parte do poder público para avaliar a efetividade desses benefícios, considerando o retorno que eles proporcionam à sociedade. Um relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) apontou que as políticas automotivas de desenvolvimento nacional custaram R$ 50 bilhões ao país desde 2010, mas "entregaram pouco desenvolvimento regional às áreas beneficiadas". Essas renúncias fiscais chegaram a custar cerca de R$ 34 mil mensais por emprego gerado, de acordo com o relatório.

Vantagens notáveis

Os benefícios fiscais concedidos ao setor de petróleo também são notáveis, com a Petrobras e outras empresas, como Bram Offshore, Modec e Brasdril, se beneficiando do programa Repetro, que isenta impostos sobre importações de bens destinados à exploração de petróleo e gás natural. Contudo, a continuidade desses benefícios após a reforma tributária ainda não está garantida, dadas as especificidades do setor.

Por fim, as empresas do setor de insumos e máquinas para o agronegócio também receberam isenções fiscais substanciais, incluindo CNH Industrial, Yara Fertilizantes, Mosaic Fertilizantes e Syngenta. Esses benefícios estão relacionados a reduções de impostos sobre a importação de fertilizantes e defensivos agrícolas, bem como ao regime Recof. A reforma tributária manteve benefícios para o agronegócio, como a taxa zero para a cesta básica, alíquota reduzida para insumos e produtos agrícolas, e isenção de impostos para produtores rurais com receita anual de até R$ 3,6 milhões.

As empresas mencionadas tiveram a oportunidade de comentar sobre os benefícios fiscais recebidos. Muitas delas destacaram que operam de acordo com a lei e que os benefícios fiscais estão disponíveis para consulta pública. Alguns ressaltaram que esses benefícios são essenciais para garantir a competitividade e o fornecimento de produtos essenciais à sociedade.

A divulgação desses dados e a reforma tributária em andamento visam fornecer maior transparência às políticas fiscais e incentivos, buscando um sistema tributário mais justo e eficiente.

Para mais informações, acesse Meionorte.com



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