Xerife de Salles pediu perdão a madeireiros e ameaçou matar fiscais do Ibama

Walter Mendes teria recorrido a táticas de “intimidação e truculência” em relação aos próprios funcionários da instituição ambiental

Ex-ministro Ricardo Salles | Getty Images
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Em uma reviravolta no cenário das investigações ambientais, trocas de mensagens e depoimentos compilados no inquérito da Operação Akuanduba evidenciam como madeireiros, envolvidos em uma série de crimes ambientais, zombaram da suposta subserviência de Walter Mendes, então superintendente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) no Pará, durante o governo de Jair Bolsonaro (PL). Paralelamente a essa ironia por parte dos empresários, Mendes teria recorrido a táticas de "intimidação e truculência" em relação aos próprios fiscais ambientais do órgão, a fim de evitar a delação, conforme as conclusões das investigações.

Mendes, um coronel aposentado das Rondas Ostensivas Tobias Aguiar (Rota) - uma unidade de elite da Polícia Militar do Estado de São Paulo (PMESP), foi designado para atuar como uma espécie de xerife local sob o comando do então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. Ambos foram recentemente acusados pelo Ministério Público Federal (MPF) de pertencerem a uma organização criminosa e de envolvimento em crimes ambientais.

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As revelações da Polícia Federal (PF) incluem mensagens datadas de 20 de janeiro de 2020, quando três contêineres contendo ipês e jatobás amazônicos estavam retidos nos Estados Unidos devido à falta de documentação adequada. Na ocasião, o então presidente da Associação das Indústrias Exportadoras de Madeiras do Estado do Pará (Aimex), Roberto Pupo, agia nos bastidores para liberar a carga, inclusive tentando cooptar agentes de fiscalização, de acordo com as investigações.

"Desculpa pela cag@da"

Mesmo com intenções questionáveis, Roberto Pupo, que faleceu em 2021, teria ficado surpreso com a atitude do superintendente do Ibama, alegando que Mendes havia pedido desculpas pelas dificuldades relacionadas à exportação ilegal de madeira. Uma mensagem de Pupo ressalta a incredulidade: "Pessoal, se eu contar para vocês que o novo superintendente do Ibama pediu desculpas pela ‘c@gada’ criada com a falta de emissão das autorizações, vocês acreditam?".

Coronel Walter Mendes | Foto: ReproduçãoAlém disso, Pupo relatou em um grupo de mensagens seu choque ao informar que o novo superintendente emitiria, por conta própria e por obrigação do cargo, autorizações para contêineres que já estavam em trânsito ou haviam chegado ao destino, mesmo após os pedidos de autorização terem sido protocolados tardiamente. Conforme documentado pela PF, essa prática de legalização de cargas já despachadas do Brasil era irregular.

A denúncia apresentada pelo MPF à Justiça Federal de Belém destaca que a conduta do xerife surpreendeu até mesmo os agentes privados envolvidos, reforçando a influência do setor madeireiro sobre o superintendente. Os procuradores alegam que Mendes prometeu autorizar a exportação de madeira já enviada ao exterior, incluindo a madeira retida no porto de destino, o que sugere uma subordinação do superintendente aos interesses dos madeireiros.

Como revelado pela PF, os esforços de lobby dos madeireiros tiveram sucesso e resultaram na emissão posterior de novas normas pelo Ibama que permitiram a "legalização" de madeiras apreendidas ilegalmente no exterior. Durante esse processo, o MPF alega que o ex-PM da Rota emitiu documentos fraudulentos e ideologicamente falsos. Como resultado, ele teria sido promovido por Salles ao cargo de coordenador-geral de Fiscalização Ambiental de Proteção Ambiental do Ibama.

Em depoimentos obtidos durante a operação policial, servidores também mencionaram uma reunião realizada em agosto de 2020, quando autoridades norte-americanas estavam investigando profundamente o incidente. Na reunião, o coronel teria feito alegadas ameaças a um servidor, instruindo-o a transmitir a mensagem aos outros. De acordo com o depoimento, Mendes teria afirmado que "se algum filha da puta enfiar o dedo no meu c*, a gente vai tirar do caminho, vai dar tiro, vai matar", antes de se retirar da sala.

Silêncio incriminatório

Embora a pessoa que ouviu essa declaração tenha considerado denunciar o incidente, ela temeu possíveis represálias. O episódio gerou debates entre os fiscais do órgão, com alguns argumentando que a frase representava o comportamento típico de um policial da Rota. O MPF interpretou que, para proteger seus interesses, Mendes recorreu à intimidação e à truculência. Atualmente, ele enfrenta acusações que incluem desacato, falsidade ideológica, advocacia administrativa e pertencimento a uma organização criminosa.

A reportagem tentou contatar Mendes para comentários, porém, não obteve sucesso em sua localização. O espaço permanece aberto para manifestações futuras.

Um ponto de tensão entre PF e MPF surgiu durante a investigação, com relação a dois depoimentos colhidos nos últimos dias da gestão do ex-presidente Bolsonaro. Após quase dois anos de investigação, esses depoimentos provocaram divergências em relação à presença de Ricardo Salles em uma reunião com madeireiros interessados em liberar cargas retidas nos Estados Unidos. Salles, que atualmente é deputado federal pelo PL de São Paulo, afirmou à PF que não participou do encontro, uma versão sustentada pela PF em seu relatório de investigação entregue aos procuradores. No entanto, o MPF alega que o ex-ministro mentiu sobre o episódio e que esteve presente no evento.

Para mais informações, acesse Meionorte.com



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